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   viagem pelas imagens e palavras do      quotidiano

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  • Foto do escritor: Jorge Campos
    Jorge Campos
  • 26 de jan. de 2021
  • 16 min de leitura

Atualizado: 1 de fev. de 2021


Estão aqui reunidos alguns documentos respeitantes não só ao primeiro módulo da Odisseia nas Imagens - O Homem e a Câmara - mas também outros relativos à fase preliminar preparatória da Programação. São exemplos da diversidade de iniciativas de caráter estruturante levadas a cabo em parcerias, designadamente com Universidades e festivais de cinema, bem como da imensa variedade de opções colocada ao dispor do público. Se a excelência da Programação foi sempre reconhecida e, muitas vezes, apontada como exemplar, a parte menos espectacular da Odisseia nas Imagens, em rigor, nunca foi bem entendida e, talvez por isso, não lhe tenha sido dada grande visibilidade mediática. E, contudo, dela dependia a concretização da ideia de lançar as bases para fazer do Porto uma Cidade de Imagens. Os documentos que se seguem são uma pequena parte dos muitos anexos deste módulo O Homem e a Câmara. Deles constam, também, listagens completas de filmes exibidos e dos participantes convidados.


Johan Van Der Keuken

Pós-Graduação em Documentário e Curtas - Metragens de Ficção


Ano Lectivo de 2000 / 2001

Universidade Católica Portuguesa do Porto

Constante do Protocolo assinado entre a Sociedade Porto 2001 e a Universidade Católica Portuguesa do Porto


Este foi o primeiro protocolo assinado pela Sociedade Porto 2001 com um estabelecimento de ensino superior no âmbito da Odisseia nas Imagens. A prioridade dada à Universidade Católica ficou a dever-se, por um lado, às suas disponibilidades de apoio logístico a iniciativas de formação e, por outro lado, à capacidade de iniciativa e de concretização de projectos dos seus elementos responsáveis. O protocolo previa, nomeadamente, a Criação de um Curso de pós-graduação em Realização Televisiva com especialização em Documentários e Curtas Metragens de Ficção. No âmbito desse curso comprometeu-se a Universidade Católica a produzir 10 documentários e 10 curtas metragens de ficção, bem como a integrar a programação da Odisseia nas Imagens no plano curricular do curso de Imagem e Som.


Plano Curricular da pós-graduação em Realização Televisiva:


1º Semestre

Escrita de Argumento I

História do Documentário e Curtas Metragens I

Cinematografia Videográfica

Seminários


2º Semestre

História do Documentário e Curtas Metragens II

Escrita de Argumento II

Pós-Produção de Vídeo

Produção de TV I

Seminários "Cinema e Arquitectura"

Seminários


3º Semestre

Produção de Televisão II

(projecto audiovisual final)

História do Documentário e Curtas Metragens III

Gestão de Projectos Audiovisuais


Docentes convidados:


Luís Proença

Marilyn Beker

José Alexandre Marques

Hugo Santander

Joseph C. Keller

Mário Coutinho dos Santos

Chris Wolf

Don Zirpola

Frank Mosvold

Mladen Milicevic

Fernando Salsinha

Luís Campos Ferreira

Maria João Arriscado

Francisco Nicholson


O Homem da Cabeça Raspada (1966), de Andre Delvaux


Programa 15x15: O Património Cinematográfico Europeu


De 16 a 23 de Março de 2000

Rivoli Teatro Municipal – Pequeno Auditório

Conferências na Universidade do Porto

Constante do Protocolo assinado com o Festival de Curtas Metragens de Vila do Conde


O programa “15 X 15: o património cinematográfico europeu” foi uma iniciativa da Coordenação Europeia de Festivais de Cinema (CEFC), um organismo europeu que agrupa mais de 160 festivais de cinema dos 15 países da União Europeia. Apresentado no Porto por iniciativa do Festival de Vila do Conde, que foi o responsável pela organização no que respeita à parte portuguesa, o programa contou com as escolhas de 15 cineastas dos 15 países da UE. Cada um foi convidado a seleccionar um filme considerado importante da respectiva cinematografia nacional, mas que não fosse muito conhecido do público ou, pelo menos, tão conhecido quanto a sua qualidade cinematográfica justificaria. Em Portugal, o FICM convidou Manoel de Oliveira, que por sua vez escolheu o filme de Paulo Rocha Verdes Anos, o qual abriu o ciclo. A CEFC suportou os custos dos direitos de exibição nos 15 países da EU, bem como de duas cópias novas de cada filme e fez questão de todas as apresentações ficarem ligadas a encontros nos quais fosse debatido o acesso ao património cinematográfico europeu, relevando o papel dos Festivais de Cinema na sua visibilidade e divulgação. Sendo estes, também, objectivos da Odisseia nas Imagens, entendeu-se integrar o programa “15 X 15” de modo, nomeadamente, a proporcionar a um público universitário um contacto mais próximo com o cinema europeu.


Filmes apresentados:


O Homem da Cabeça Raspada, de Andre Delvaux

Det gode og det onde, de Jorgen Leth

Der Verlorene, de Peter Lorre

The Ogre of Athens, de Nikos Koundouros

Plácido, de Luis Garcia Berlanga

La dame d’onze heures, de Jean Devaivre

Angel, de Neil Jordan

Le legioni di Cleopatra, de Vittorio Cottafavi

Troublemaker, de Andy Bausch

Rooksporen, de Frans van de Staak

Himmell oder Holle, de Wolfgang Murnberger

Os Verdes Anos, de Paulo Rocha

Eight Deadly Shots, de Mikko Niskanen

Bara en mor, de Alf Sjoberg

A Matter of Life and Death, de Michael Powell e Emeric Press-burger


Participantes:


André Delvaux (Realizador)

Antoine Bonfanti (Engenheiro de Som)

Paulo Rocha (Realizador)

Frans van de Staak (Realizador)

Ulrike Ottinger (Realizador)

José Manuel Costa (Cinemateca Portuguesa)

Heather Stewart (British Film Institute)

François Ballay (Representante da Coordenação de Festivais de Cinema)


Verdes Anos (1963) de Paulo Rocha

O Olhar de Ulisses - O Homem e a Câmara


De 2 a 10 de Maio de 2000

Rivoli Teatro Municipal – Pequeno Auditório

Rivoli Teatro Municipal – Grande Auditório


O texto que se segue dá conta dos primeiros passos da Odisseia nas Imagens e do seu primeiro módulo O Homem e a Câmara tendo sido publicado no catálogo do primeiro episódio do Ciclo O Olhar de Ulisses.



Uma Odisseia nas Imagens


O Olhar de Ulisses

Terás sempre Ítaca no teu espírito,

que lá chegar é o teu destino último.

Mas não te apresses nunca na viagem.

Cavafy (1911)


A programação de Cinema, Audiovisual e Multimédia do Porto 2001 - Capital Europeia da Cultura é concebida como um percurso durante o qual o dado a ver exige a participação, promove a descoberta e estimula a aventura. É um desafio centrado na fulcralidade da Imagem enquanto elemento de revelação. Entendida em termos dinâmicos, a Programação é aqui tanto objecto de prazer quanto elemento detonador do saber e do saber fazer. Nela cabe, naturalmente, em primeiro lugar, a cidade de imagens que o Porto sempre foi e, como tal, o olhar retrospectivo que permite reconhecer a sua identidade. Mas essa cidade de imagens, sendo também um lugar de futuro, exige, de igual modo, um olhar prospectivo, ousado e universal. Da síntese desses olhares cruzados resultará um lugar do presente fortemente identitário e convivial, mas também radicalmente interrogativo e inapelavelmente transformador. À cidade caberá sempre decidir, em função do desafio que lhe foi lançado, sobre os contornos e os limites da mudança que lhe é proposta.


Como âncora e assinatura de toda a Programação foi pensado um evento articulado modularmente ao longo de ano e meio, cuja lógica permite, por um lado, reforçar estruturas e iniciativas existentes e, por outro, potenciar e agrupar sinergias dispersas, conferindo-lhes coesão e coerência. Esse evento denomina-se Odisseia nas Imagens e acolhe o Cinema, a Televisão e os Novos Média. Os seus cinco módulos integram as actividades das escolas de Ensino Superior do Porto, e também da Universidade do Minho, cujos cursos de algum modo se relacionem com o universo das imagens e dos sons. No seu conjunto, quando 2001 estiver prestes a cumprir-se, os estudantes destas escolas terão produzido e realizado mais de meia centena de trabalhos repartidos pelo documentário, a curta metragem de ficção, a vídeo arte, a animação e o jornalismo de imagens em movimento.



O Olhar de Ulisses é a parte da Odisseia nas Imagens que se revê em filmes fundamentais da História do Cinema, prestando uma particular atenção a um dos géneros em relação ao qual a Sociedade Porto 2001 fez uma opção estratégica: o documentário. Os outros géneros são as curtas metragens e a animação. Em qualquer dos casos, acreditamos haver condições no Porto e na sua região para o desenvolvimento, a médio prazo, de uma produção de qualidade.

Mas se O Olhar de Ulisses privilegia o documentário, nem por isso prescinde da ficção. Pelo contrário, documentário e ficção surgem aqui articulados em termos de complementaridade proporcionando, a par de uma releitura dos clássicos, a aventura da exploração do modo de significar das imagens. O primeiro módulo da retrospectiva é disso paradigmático. Recolhe a designação O Homem e a Câmara do filme tese de Dziga Vertov com o mesmo nome e pretende reeditar, actualizando, a cine-sensação do mundo enquanto factor de descoberta e elemento de elucidação do real. Esse real, porém, será sempre um real imaginado: só através dos artifícios de uma linguagem ele se revela.


Em O Homem e a Câmara dá-se também conta da gramática emergente das imagens em movimento e da sua relação com o olho, como em O Som e a Fúria, o segundo módulo de O Olhar de Ulisses se dará conta da gramática do som – e do silêncio – e da sua relação com o ouvido. Quer num caso, quer no outro, é dada carta branca a Jean-Michel Arnold, responsável do Centre Nationale de la Recherche Scientifique – Images/Media, de Paris, pela selecção de filmes sobre o olho e o ouvido a apresentar no âmbito das Imagens da Ciência que complementam a retrospectiva. Estamos, enfim, a iniciar uma viagem pelo mundo das imagens com destino previsto: projectar melhor a visibilidade da nossa cidade e da sua região procurando criar condições para produções de qualidade. Mas, não nos apressemos, porque o percurso é aventuroso e só nele reside o sentido da viagem, o sentido do olhar.

Jorge Campos


Dario Oliveira





Homem da Câmara, de Dziga Vertov com música ao vivo de Cinematic Orchestra – Estreia Mundial


(Filme Concerto)

2 de Maio de 2000

Coliseu do Porto


A abertura oficial da Odisseia nas Imagens foi feita com um clássico de Dziga Vertov e teve uma forte influência do jazz presente na música da Cinematic Orchestra. Foi a primeira iniciativa no âmbito da programação com o intuito de revisitar clássicos do cinema através da encomenda de partituras originais a compositores consagrados.


Dziga Vertov, em 1929, escreveu sobre os princípios a seguir na construção de eventuais partituras sonoras para filmes mudos. A propósito do seu O Homem da Câmara de Filmar, um filme inovador e vanguardista, qualquer abordagem musical intentada por músicos desafiados a fazê-la teria necessariamente de ter em conta esses princípios. Sabendo que a tarefa não seria fácil Jason Swinscoe e a sua banda aceitaram o desafio. Em sintonia com as ideias de Vertov sobre as ligações imagem-som, defensora do “assincronismo”, a Cinematic Orchestra elaborou a sua música num contexto de contraponto deixando espaço para que as imagens respirassem, de modo a ampliar a dimensão mais profunda do filme.

Para alguém que considera os computadores e os samplers algo constrangedores, Jason Swinscoe, DJ, produtor e responsável pelas composições da Cinematic Orchestra, continua a gostar do som puro dos instrumentos. Admirador incondicional de Miles Davis, Bernard Herrmann, John Coltrane, Sun Ra e Lalo Schifrin, entre muitos outros, é o responsável pelo álbum de estreia da Cinematic Orchestra Motion em 1999, uma genial banda sonora para um filme que não existe.


Participantes:


Jason Swinscoe (líder / sampler)

Tom Chant (saxofone)

Phil France (baixo)

Thomas Daniel Howard (bateria)

Patrick Carpenter (DJ / electrónicas)

Jonathan Digby (técnico de som)

Denise Bayliss (assistente de produção)

Jeremy Sean Tuson (produção)



O Olhar de Ulisses - O Homem e a Câmara


De 3 a 10 de Maio de 2000

Rivoli Teatro Municipal – Pequeno Auditório

Em colaboração com a Cinemateca Portuguesa

Com o apoio da Embaixada de França e Instituto Francês do Porto


O Salão de Música (1958) de Satiaji Ray

Este episódio de O Olhar de Ulisses deu a ver a primeira fase da história do Cinema Documental, abrindo as portas à memória. A partir daqui, cada um dos módulos teria uma temática decorrente dos diversos períodos de uma história do Documentário entendida num contexto de cruzamento com o Cinema contemporâneo (dos Lumiére, a Pelechian, passando por Vertov, Vigo, Oliveira, Ruttmann, Ivens, Storck, Epstein, Malraux, Rouch, Murnau, Leacock, Brault, Resnais, Kiarostami, Van der Keuken, Flaherty, Grierson, Paul Strand, Cartier-Bresson, Man Ray, Leni Riefensthal, Depardon, Paul Rotha, Basil Wright, Chris Marker, Frank Capra, Robert Altman, Frederick Wiseman e outros mais).


Filmes apresentados por ordem alfabética:


Bab El Hadid, de Youssef Chahine

Berlim, Sinfonia de uma Capital: ver Berlin, Die Sinfonie Einer Grosstadt

Berlin, Die Sinfonie Einer Grosstadt, de Walter Ruttman

Beschreibung Einer Insel, de Rudolph Thome e Cynthia Beatt

Blind Kind, de Johan van der Keuken

Brug, De - Joris Ivens

Caire...Raconté par Chahine, Le, de Youssef Chahine

Cairo... Contado por Chahine, O: ver Caire...Raconté par Chahine, Le

Cameraman, The de Edward Sedgwick e Buster Keaton



Caminho do Sul, A: ver Weg Naar Het Zuiden, De

Cão Andaluz, O: ver Chien Andalou, Un

Carrosse d’Or, Le, de Jean Renoir

Comédia e a Vida, A: ver Carrosse d’Or, Le

Chang, de Meriam C.Cooper e Ernst Schoedesack

Chelovek S Kinoapparatom, de Dziga Vertov

Chien Andalou, Un, de Luis Bunuel

Chuva: ver Regen

Criança Cega, A: ver Blind Kind

Départ de Ciclyste à Rome - Operadores Lumière

Depart du Caire (en Chemin de Fer) - Operadores Lumière

Descrição de uma Ilha: ver Beschreibung Einar Insel

Douro, Faina Fluvial, de Manoel de Oliveira

Citizen Langlois, de Edgardo Cozarensky

Estação do Cairo, A: ver Bab El Adido

Estrela do Mar: ver Etoile de Mer, L'

Etoile de Mer, L' de Man Ray

F for Fake, de Orson Welles

Grass: A Nation Battle for Life de Meriam C.Cooper e Ernst Schoedesack

Herman Slobbe, Blind Kind 2, de Johan van der Keuken

Hippocampe, L’, de Jean Painlevé

Homem da Câmara de Filmar, O: ver Chelovek S Kinoapparatom

Hurdes- Tierra Sin Pan, Las, de Luis Bunuel

Idílio na Praia: ver Idylle à la Plage, Une

Idylle à la Plage, Une , de Henri Storck

Images d’Ostende, de Henri Stock

Jalsaghar, de Satyajit Ray

King Kong, de Meriam C.Cooper e Ernst Schoedesack

Kino Pravda 21, de Dziga Vertov

Louis Lumière-Eric Rohmer

Mannhatta. de Paul Strand

Mer Dare. de Artavazd Pelechian

Mest’ Kinematograficheskogo Operatora, de Wladyslaw Starewicz

Misère au Borinage- Henri Storck e Joris Ivens

Moana, de Robert J.Flaherty



Nada Mais do que as Horas: ver Rien que les Heures

Nanook of The North, de Robert J.Flaherty

Niewe Gronden, de Joris Ivens

Novas terras: ver Niewe Gronden

90º South, de Frank H. Hurley

Olhar de Ulisses, O: ver Vlemma tou Odyssea, To

Peeping Tom, de Michael Powell

Philips Radio, de Joris Ivens

Place de l’Opera-- Operadores Lumière

Place de la Citadelle-- Operadores Lumière

Place du Governement-- Operadores Lumière

Pont de Kasr-el-nil, Le-- Operadores Lumière

Ponte, A: ver Brug, De


F For Fake (1973) de Orson Welles

Por Primera Vez, de Octávio Cortázar

Propos de Nice, A , de Jean Vigo

Regen - Joris Ivens

Rien que les Heures, de Alberto Cavalcanti

Rue Ataba-el-Khadra- Operadores Lumière

Rue Sayeda-Zeinab - Operadores Lumière

Rue Sharia-el-Nahassine- Operadores Lumière

Rue Tath-el-Rab- Operadores Lumière

Saída do Pessoal Operário da Camisaria Confiança, de Aurélio da Paz dos Reis

Salão de Música: ver Jalsaghar

Sinfonia Industrial: ver Philips Radio

South, de Herbert Pounding

Tabu, W.F. Murnau

Terra Sem Pão: ver Hurdes- Tierra Sin Pan, Las

Vingança do Cameraman, A: ver Mest’ Kinematograficheskogo Operatora

Vítima do Medo: ver Peeping Tom

Vlemma tou Odyssea, To, de Theo Angelopoulos

Weg Naar Het Zuiden, De, de Johan van der Keuken



Participantes por ordem alfabética:


Alberto Seixas Santos (realizador)

Alok Nandi (autor e realizador)

António Rodrigues (programador da Cinemateca Portuguesa)

António Roma Torres (médico psiquiatra, crítico de Cinema)

Fernando Lopes (realizador)

Gerald Collas (produtor de Documentários)

Gerald Leblanc (poeta e crítico de Cinema)

Jean-Louis Comolli (realizador)

Jean-Michel Arnold (director do CNRS Images/media)

João Bénard da Costa (presidente da Cinemateca Portuguesa)

John Boswell (músico)

José Manuel Costa (vice-presidente da Cinemateca Portuguesa)

Manoel de Oliveira (realizador)

Manuel António Pina (poeta, escritor e jornalista)

Olivier Smolders (realizador)

Paulo Rocha (realizador)

Regina Guimarães (realizadora)

Rodrigo Afreixo (jornalista, crítico de Cinema)

Rudolfe Thome (realizador)

Saguenail (realizador)

Serge Meurant (poeta, responsável do Festival de Cinema Documental "Filmer à tout prix")

Sharmila Roy (vocalista e compositora)


Sharmila Roy

Concerto Sharmila Roy


8 de Maio de 2000, (após a projecção do filme “O Salão de Música”, de Satyajit Ray, integrado no Ciclo de Cinema O Olhar de Ulisses – O Homem e a Câmara

Rivoli Teatro Municipal – Pequeno Auditório


Texto de apresentação publicado no catálogo de O Olhar de Ulisses I – O Homem e a Câmara


O salão, a sala, o palco…


Uma sala de cinema do Porto transforma-se em salão de música. O écran dá lugar ao palco. A cantora Sharmila Roy e o músico John Boswell levam-nos a viajar pelas ragas nas margens do Ganges. Uma luz invulgar nos crescendos da música Indiana, após a projecção do filme de culto O Salão de Música de Satyajit Ray.


Sharmila Roy é vocalista e compositora. Emprestou a sua voz a numerosos filmes (Mahabharata de Peter Brook, O Intermediário de Satyajit Ray…) e já se apresentou em concerto em todos os países europeus, no Japão, nos Estados Unidos… Neste momento prepara e adapta Chandalika, uma peça cantada e dançada.


John Boswell é percussionista, intérprete e pedagogo. Formado em bateria, completou a sua paleta de ritmos após uma estadia na Índia. O trabalho de Boswell, além dos estágios que dirige, oscila entre as músicas contemporâneas, para o teatro ou para a dança, e a música clássica Indiana.



Imagens da Ciência I – Arqueologia e Desvios do Cinema Científico


10 de Maio de 2000

Rivoli Teatro Municipal – Pequeno Auditório

Com o apoio do Instituto Francês do Porto

Com Jean-Michel Arnold em colaboração com o CNRS de Paris


Jean-Michel Arnold

Texto de apresentação publicado no Catálogo de O Olhar de Ulisses – O Homem e a Câmara:


Modo de conhecimento antes de ser um modo de comunicação, o cinema científico precedeu o cinema espectáculo.


Todos os historiadores do cinematógrafo concordaram em colocar na origem da "imagem em movimento" as aventuras de grandes sábios. Exploradores da persistência retiniana, valorosos ópticos, astuciosos químicos e investigadores constituíram esta fabulosa galeria de protótipos chamado o "pré-cinema".


Depois, na própria origem da câmara, 20 anos antes dos irmãos Lumière, novamente cientistas (um astrónomo e um psicólogo) construíram umas máquinas esquisitas para modular, registar, analisar, comparar, guardar memória da passagem do tempo... Os seus movimentos de planetas, voos de aves, galopes de militares e saltos de gatos formam, simultaneamente, os incunábulos do cinema e os da investigação científica em imagens animadas.


Todos os historiadores prestam este tributo à ciência. Depois, apressam-se a elogiar as melhores trucagens de Georges Méliès e o peso ingénuo do filme artístico.


Ora, se virmos bem, os inventores deste instrumento dotaram-no, igualmente, de uma linguagem.


Enquanto que os operadores da Société Lumière - meio jornalistas, meio fotógrafos - descobriam a grande reportagem, os cientistas, ao apoderarem-se do cinema, afirmaram a modernidade deste.


Assim, num período de alguns anos e quando os primeiros realizadores se esforçavam por reproduzir, adaptando-os a esta arte nova, os modos de representação dominantes (como o teatro ou a pintura), os cientistas compõem a gramática cinematográfica: ângulo de filmagem, enquadramento, luz, velocidade, dramaturgia...


O programa proposto tentará, pois, contar por imagens esta maravilhosa aventura: a invenção do cinema (instrumentos e linguagem) pelos cientistas. É formado por partes de documentos raros e preciosos, conservados nos institutos de investigação ou nos arquivos internacionais especializados. Estas obras são, na sua maioria, desconhecidas do grande público e, muitas vezes, até da comunidade científica apesar de, no início do século, terem constituído para esta a fonte de investigação.


Tendo inventado o cinema, os investigadores, com a seriedade e a ingenuidade que os caracteriza, vão estabelecer uma frutuosa cumplicidade com os cineastas.


Nas suas ficções e nos seus documentários, os realizadores servem-se, frequentemente, dos espantosos relatos da História das ciências e das utopias autorizadas pelos progressos da investigação.


Jean Painlevé, pioneiro do cinema científico

Figuras de vitral ou agitadores sociais (com os traços de Emil Jannings, Paul Muni ou de Walter Pidgeon), Louis Pasteur, Robert Koch ou Albert Eisntein mobilizaram os espectadores para o esforço da investigação e incentivaram muitas vocações nos adolescentes atraídos pelas salas escuras.


Homens poderosos, eternos sonhadores, sábios loucos, benfeitores da humanidade ou génios artesanais, os heróis de bata branca permitem todos os sonhos (e alguns temores): viagens inter galácticas, cozinhas automatizadas, elixires da juventude ou expedições ao mundo dos pigmeus...


Por vezes, os grandes cientistas estão mesmo presentes nas filmagens. Georges Wilhelm Pabst convenceu Sigmund Freud a escrever-lhe um guião original. Quando estava a rodar A mulher na Lua, Fritz Lang contrata como conselheiros os melhores peritos em balística. Separar-se-ão mais tarde, um para ir trabalhar nos Estados Unidos na bomba atómica (Ley) e o outro para equipar com as bombas V2 o campo nazi (Oberth), ao mesmo tempo que Hitler manda destruir as cópias do filme...


Paralelamente a esta função de "conselheiros técnicos", os cientistas enriquecem as suas investigações com os instrumentos que eles próprios ajudaram a forjar. Alguns deles, escrevendo a sua ciência por imagens, revelaram-se grandes cineastas: Jean Painlevé, Jean Rouch, Haroun Tazieff... Outros, como Michael Crichton, passam para o outro lado do espelho. O público mantém-se fiel a todos. E o triunfo da ciência - na sua qualidade de obreira da realidade - é hoje total. Criou o espectáculo cinematográfico, pôs a ficção a jogar em seu proveito. Desde que o documentário, a "primeira parte educativa e cultural", perdeu o seu lugar legítimo nas noites familiares no Cinema Paradiso, as imagens da investigação ocuparam a longa metragem. É então que, imperceptivelmente, consciente ou inconscientemente a nível dos produtores e dos realizadores, o "documento científico" se instala nos filmes de grande audiência. Buñuel, Visconti, Spielberg, no seu tempo, já o haviam reivindicado. E hoje, não há campeão de bilheteira que não tenha uma grande sequência reservada à "descoberta da realidade". O Padrinho, A viagem ao fim da noite abrem com uma boa hora de espantosos documentos etnográficos. De onde vem o sucesso do Grand Bleu, da Guerra do fogo, de O Parque Jurássico? Qual foi o grande laboratório que forneceu as imagens do genérico da Ilha do Dr. Moreau? Será por acaso que Indiana Jones é arqueólog


Jean-Michel Arnold


Annick Demeule




Programa


“Arqueologia e Desvios do Cinema Científico” - “Cérebro, partes nobres”


Filmes apresentados:


"Je vous aime", imagens do do fonoscópio de Georges Demeny (1891)

"Idiotas, degenerados e loucos", imagens sequenciais de Albert Londe (1892)

"A neuropata" de Roberto Omegna (1908)

"O reconstrutor de cérebros" de Emil Cohl (1910)

"Pequenas causas, grandes efeitos" de O'Galop (1918)

"Os mistérios da mente (um sonho)" de Georges Wilhelm Pabst, guião de Sigmund Freud (1926)

"O âmago dos seus tormentos" (extracto) de Mary Pattenden (1993)

"Um violino na cabeça" (extracto) de Claude Edelman (1994)

"A era dos neurónios" de Marcel Pouchelet e Jean-François Ternay (1999)


Participantes:


Jean-Michel Arnold

Annick Demeule

Jean-François Sabouret




Berlim, Sinfonia de uma Cidade de Walther Ruttmann com música ao vivo de DJ Spooky & Freight Elevator Quartet


Filme Concerto

10 de Maio de 2000

Rivoli Teatro Municipal – Grande Auditório


DJ Spooky, representante da tendência “ambient” mais concetualista, omnipresente no panorama dos clubes vanguardistas de Nova Iorque onde a palavra “arte” ainda significa muito, trabalha num registo de colagem de sons que faz pensar nas teorias da montagem das vanguardas do final do período mudo. Para essas vanguardas a música de filmes deveria, de uma forma subtil e recusando a redundância, fazer nascer um novo ritmo a partir da tensão criada entre imagens, sons e silêncio.


É isso o que pretendem DJ Spooky e o Freight Elevator Quartet: uma batalha, um jogo de tensões musicais que eles próprios designam por “assincronia experimental” e que resulta da justaposição de sons à partida não pertencentes à mesma família. Com violoncelos, guitarra e didjerido, aos quais junta a manipulação electrónica, DJ Spooky inaugura um futuro tecnológico utópico, com evidentes referências aos escritos futuristas de Severini e Marinetti.


Tendo origem no departamento de música da Columbia University, os Freight Elevator Quartet ultrapassam todos os conceitos da música electrónica actual, de tal forma que dos breakbeats aos instrumentos acústicos ou digitalizados, os sons soam como algo realmente novo. “Arte do ruído” ou “futurismo na era digital” é o que esta orquestra, que integra o hip-hop e o drum’n’bass de DJ Spooky no seu repertório, executa nesta abordagem de Berlim, Sinfonia de uma Cidade.


No final dos anos 20, evocava-se a cultura urbana, a arquitectura, o indivíduo e a arte. Essa mesma atmosfera é agora revisitada celebrando as possibilidades da cultura digital, do cinema e da electrónica.


Participantes:


Paul Miller a.k.a DJ Spooky – DJ e contrabaixo eléctrico

Roger Luke Dubois – Sintetizadores analógicos

Paul Feuer – Didjeridoo

Rachael Finn – Violoncelo

Gabriel Price - Técnico

Steve Cohen - Manager



Festival Internacional de Curtas Metragens de Vila do Conde/ 2000


De 4 a 9 de Julho de 2000

Auditório Municipal de Vila do Conde

Extensão do FICMVC

“O Nosso Século”

De 10 a 14 de Julho de 2000

Rivoli Teatro Municipal – Pequeno Auditório

Iniciativa no âmbito do protocolo assinado com o Festival Internacional de Curtas Metragens de Vila do Conde




“O Nosso Século”


A passagem de um século é para muitos um tempo propício a revisões, reflexões e conclusões. No entanto, a lógica deste programa foge um pouco a essa tentação de descrever os grandes acontecimentos do Século XX ou de mostrar os “melhores” filmes. Essa interpretação tem vindo a ser feita desde que o cinema fez cem anos. Basta lembrar que “O Nosso Século” é também o século do cinema.


Neste caso, porém, o mote foi dado a alguns cineastas, todos eles com uma obra singular em relação às correntes dominantes do cinema. A resposta de todos eles afastou-se das tais descrições de acontecimentos relevantes, acabando por ser muito mais o século “deles” que o “nosso”, e ainda bem. É que, assim, somos confrontados com filmes e autores que articulam uma teia de afinidades e cumplicidades evidenciando um estatuto “marginal”.


Nenhum dos filmes exibidos no Rivoli Teatro Municipal foi mostrado em Vila do Conde. A lógica da programação, relacionada com o formato habitual dos filmes do Festival, fez com que no Porto se tivesse privilegiado a exibição das longas metragens dos cineastas convidados, os quais continuaram a acompanhar as projecções no Rivoli Teatro Municipal.


Filmes apresentados:


Working With Orson Welles, de Gary Graver

Boliden, de Walter Feistle, Signers Coffer, de Peter Liechti, e Why Should I Buy a Bed When All I Want Is Sleep?, de Nicholas Humbert e Werner Penzel

Tonespor, de Lejf Marcussen

Jeux des anges, de Walerian Borowczyk

Andrei Svislotski, de Igor Kovalyov

Odpriski, de Jerzy Kucia

La jetée, de Chris Marker

Dal polo all’equatore, Io ricordo, Uomini anni vita, Prigionieri della guerra e Su tutte le vette è pace, todos de Yervant Gianikian e Angela Ricci-Lucchi


Participantes:


Gary Graver (realizador)

Jillian Graver (produtora)

Nicholas Humbert (realizador)

Werner Penzel (realizador)

Simone Furbringer (realizadora)

Brothers Quay (realizadores)


Les Jeux Des Anges (1964) de Walerian Borowczyk


  • Foto do escritor: Jorge Campos
    Jorge Campos
  • 23 de jan. de 2021
  • 6 min de leitura

Atualizado: 26 de jan. de 2021


Dziga Vertov. Fonte: Globo

Reitero, este texto resulta basicamente de um dos capítulos da minha tese de doutoramento Viagem pelo(s) Documentário(s). Reporta a acontecimentos com cerca de 20 anos, o que, desde logo, obriga numa visão atual a um esforço de distanciamento. Há, como não podia deixar de ser, informações datadas e até desatualizadas. A leitura, tantas vezes solicitando a consulta de anexos e documentos tão numerosos que seria impossível tê-los aqui presentes, pode suscitar alguma dificuldade. Para mais, sendo a publicação feita em blocos, dada a sua extensão, as notas remissivas tiveram de ser alteradas. Para melhor compreensão devem, no entanto, ser lidas. Aquilo que me parece fundamental é a reflexão levada a cabo quer para efeito da concretização da Odisseia nas Imagens quer para a avaliação sistemática que dela foi sendo feita. Nesse sentido, pareceu-me oportuno dar a conhecer os seus traços fundamentais e, desse modo, suscitar algumas questões que continuam a ser pertinentes em termos da definição de políticas culturais - quero acreditar que ainda faz sentido falar em políticas culturais. É com satisfação que verifico que, ao fim e ao cabo, após 20 anos, sobretudo na área do Ensino Superior, há marcas da Odisseia na Imagens. Aqui, após a elucidação dos seus fundamentos, princípios, parcerias e encomendas, começa a falar-se da Programação. O primeiro de quatro módulos foi O Homem e a Câmara.


(Continuação da Odisseia nas Imagens V)


A Programação dos quatro módulos da Odisseia nas Imagens


Vejamos agora, em termos de Programação de iniciativas e eventos, as formas encontradas para dar resposta ao conjunto das questões preliminares anteriormente elencadas. Fá-lo-emos em dois momentos, sendo que no primeiro serão abordados aspectos gerais e no segundo as matérias relacionadas com a programação dos documentários. Em relação a qualquer deles, e especialmente em relação ao segundo, procuraremos introdudir algumas notas críticas, por forma a elucidar argumentos que ossam contribuir para a pertinência das conclusões.


O primeiro módulo da Programação decorreu de 2 a 10 de Maio de 2000. Anteriormente, por razões de ordem simbólica e dada a importância atribuída ao ensino e à formação, principiara na Universidade Católica a 1ª Pós-Graduação em Documentário e Curtas Metragens de Ficção e tivera lugar uma iniciativa da Coordenação Europeia de Festivais Europeus denominada 15x15: O Património Cinematográfico Europeu, que juntou diversos realizadores e especialistas entre os quais André Delvaux, Paulo Rocha e o representante da Coordenação François Ballay [1].


Para trás ficava um período durante o qual, para além de todo o trabalho preparatório, fora necessário ultrapassar alguns problemas delicados, nomeadamente o conflito aberto entre o Ministério da Cultura e a Sociedade Porto 2001 que levara à demissão do seu presidente Artur Santos Silva e à nomeação de uma nova responsável, Teresa Lago. Foi nessa altura, quando subiam de tom as críticas e insinuações sobre uma alegada incapacidade de dar corpo à Programação, que uma fuga de informação dando a conhecer em detalhe o trabalho realizado e as linhas gerais do que iria acontecer veio reforçar a posição dos programadores e dissipar dúvidas quanto ao projecto cultural. No jornal Público de 27 de Novembro de 1999 o crítico Augusto M. Seabra, num artigo intitulado Isto é uma Capital Cultural!, escreveu:


“Pois bem, programação cultural há. As linhas gerais do Porto 2001 devem ser saudadas como o mais sério esforço até hoje feito em Portugal de pensar uma cidade em termos culturais, isto é, atender às suas tradições, dimensão, localização internacional, necessidades de requalificação urbana e de oferta de espectáculos, valorização e estímulo do potencial criador e mobilização da diversidade de públicos [2]”.



O Homem e a Câmara


Com a situação interna relativamente estabilizada, o evento inaugural do primeiro módulo da Odisseia nas Imagens foi agendado para o Coliseu do Porto, a maior sala de espectáculos da cidade: o filme O Homem da Câmara de Filmar de Dziga Vertov com música ao vivo da Cinematic Orchestra [3]. Três mil pessoas esgotaram a lotação. A crítica foi unânime. Para citar apenas dois exemplos, no Diário de Notícias, Marcos Cruz afirmava: “Uma noite mágica caiu sobre o Porto fazendo com que todos os caminhos do encantamento fossem dar ao Coliseu [4]”. No Público, Amílcar Correia dizia que “o resultado não podia ter sido mais surpreendente [5]”. Na Visão, reportando ao primeiro módulo O Homem e a Câmara [6] João Mário Grilo comentava: “Com um arriscado, mas imaginativo, figurino de programação, começou, no Porto, a Odisseia nas Imagens, o programa audiovisual da Capital da Cultura [7]”.





Foi também o início do primeiro módulo de O Olhar de Ulisses [8], em colaboração com a Cinemateca Portuguesa, cuja programação deveria incidir essencialmente sobre o filme documentário, mas proporcionando olhares cruzados e, por vezes inesperados, com filmes marcantes da História do Cinema. Este ciclo, de pendor manifestamente cinéfilo, cujo título recupera o filme homónimo de Theo Angelopoulos realizado em 1995 sobre a errância de um cineasta (Harvey Keitel) à procura daquele que seria o filme seminal da cinematografia grega, transformar-se-ia, desde logo, numa referência do conjunto da Programação.


No seu primeiro catálogo [9], a par de informações detalhadas sobre filmes e participantes [10], explicitavam-se os propósitos da Odisseia nas Imagens:


“A programação de Cinema, Audiovisual e Multimédia do Porto 2001 - Capital Europeia da Cultura é concebida como um percurso durante o qual o dado a ver exige a participação, promove a descoberta e estimula a aventura. É um desafio centrado na fulcralidade da Imagem enquanto elemento de revelação. Entendida em termos dinâmicos, a Programação é aqui tanto objecto de prazer, quanto elemento detonador do saber e do saber fazer. Nela cabe, naturalmente, em primeiro lugar, a cidade de imagens que o Porto sempre foi e, como tal, o olhar retrospectivo que permite reconhecer a sua identidade. Mas essa cidade de imagens, sendo também um lugar de futuro, exige, de igual modo, um olhar prospectivo, ousado e universal. (...) À cidade caberá sempre decidir, em função do desafio que lhe foi lançado, sobre os contornos e os limites da mudança que lhe é proposta [11]”.


O Homem da Câmara de Filmar com música ao vivo da Cinematic Orchestra. A propósito da sessão inaugural da Odisseia nas Imagens escreveu Amílcar Correia no jornal Público: “Sete décadas separam O Homem da Câmara de Filmar realizado por Dziga Vertov em 1929 e Motion a banda sonora para um filme imaginário que a Cinematic Orchestra editou no ano passado. Apesar da distância temporal e estética entre as duas obras, a equipa responsável pela programação audiovisual do Porto 2001 vislumbrou eventuais pontos de confluência entre o vanguardismo do cineasta russo e o jazz heterodoxo do colectivo de Jason Swinscoe. E o resultado não podia ter sido mais surpreendente [12]”.

O Homem e a Câmara, designação deste primeiro módulo, comum à Odisseia na Imagens e a O Olhar de Ulisses, recuperou o título do filme tese de Dziga Vertov pretendendo reeditar, actualizando, a cine-sensação do mundo enquanto factor de descoberta e elemento de elucidação do real, sendo que esse real seria sempre um real imaginado. Dando conta da gramática emergente das imagens em movimento e da sua relação com o olho este primeiro programa integrou uma componente de Imagens da Ciência da autoria de Jean-Michel Arnold, responsável do Centre Nationale de la Recherche Scientifique-Images/ Media, de Paris, a quem foi dada carta branca para uma selecção de filmes [13]. Escrevendo sobre a Arqueologia e Desvios do Cinema Científico [14], dizia Jean Michel Arnold:


“Enquanto que os operadores da Société Lumière – meio jornalistas, meio fotógrafos – descobriam a grande reportagem, os cientistas, ao apoderarem-se do cinema, afirmaram a modernidade deste. (...) O programa proposto tentará, pois, contar por imagens esta maravilhosa aventura: a invenção do cinema (instrumentos e linguagem) pelos cientistas. É formado por partes de documentos raros e preciosos, conservados nos institutos de investigação ou nos arquivos internacionais especializados. Estas obras são, na sua maioria, desconhecidas do grande público e, muitas vezes até, da comunidade científica apesar de, no início do século, terem constituído para esta a fonte de investigação [15]”.


The Cinematic Orchestra

Este primeiro módulo teve ainda um filme concerto com Berlim, Sinfonia de uma Cidade (1927) de Walter Ruttmann com música ao vivo de DJ Spooky & Freight Elevator Quartet e uma extensão do Festival de Curtas Metragens de Vila do Conde denominada O Nosso Século [16]. Tratando-se da primeira grande iniciativa da Programação Cultural do Porto 2001 a Comunicação Social dedicou-lhe relevante espaço e, de um modo geral, as apreciações foram positivas [17].

Notas remissivas


[1] . Anexo I – pp. 3-20.

[2] . Anexo III – pp. 39-40.

[3] . Anexo I – p. 26.

[4] . Anexo I – p. 44.

[5] . Anexo I – p. 45.

[6] . Anexo I – pp. 21-36.

[7] . Anexo I – p. 51.

[8] . Anexo I – pp. 27-34.

[9] . Anexo I – p. 24.

[10] . Anexo I – pp. 27-30.

[11] . Anexo I – p. 23.

[12] . Anexo I – p. 45

[13] . Anexo I – p. 31-34.

[14] . Anexo I – p. 31.

[15] . Anexo I – p. 32

[16] . Anexo I – p. 35-36.

[17] . Ver alguns exemplos no Anexo I – pp. 9-20. Na verdade, escrutinadas as dezenas de recortes de imprensa sobre O Homem e a Câmara não se encontra qualquer nota negativa, embora a crítica tenha manifestado reservas quanto ao modo como DJ Spooky equacionou a sua partitura para Berlim, Sinfonia de uma Cidade. - Nota do Autor


Berlim, Sinfonia de uma cidade (1926) de Walther Ruttmann

(Continua)

  • Foto do escritor: Jorge Campos
    Jorge Campos
  • 7 de jan. de 2021
  • 26 min de leitura

Atualizado: 20 de out. de 2023

Neste texto, prossegue a elucidação quanto aos objectivos da Odisseia nas Imagens. Fala-se das parcerias e áreas de intervenção estratégica, bem como dos projectos, encomendas e ações de formação considerados fundamentais para a sua concretização. Para melhor compreensão do que se segue, sugere-se a leitura das notas remissivas nas quais são abordadas, designadamente, questões relacionadas com a RTP e o Fantasporto.


(continuação Porto 2001 - Odisseia nas Imagens IV)


William Klein, fotógrafo e cineasta, um dos convidados da Odisseia nas Imagens e o programador Dario Oliveira. Foto: Cesário Alves

Elucidação de objectivos da Odisseia nas Imagens


A reflexão a propósito da História do Cinema no Porto, dos Festivais, das Universidades e do Centro de Produção do Porto da RTP, bem como as questões suscitadas, tiveram expressão no documento respeitante ao último trimestre de 1999, no qual se procedia a uma primeira abordagem daquilo que poderia viria a ser a Programação de Cinema, Audiovisual e Multimédia [1]. O documento dava conta, a abrir:


“A primeira ideia que ocorre no âmbito dos eventos a programar para o Porto 2001 - Capital Europeia da Cultura é a ideia da visibilidade. Numa primeira leitura, estaríamos perante um conceito cujo valor instrumental seria testado em função do tempo e do espaço dedicados à divulgação em antena, ou através dos circuitos da sociedade da informação, do conjunto de iniciativas constantes da programação global. Este pôr o Porto no mapa exige, porém, o entendimento, a um outro nível, de uma vertente complementar dessa dimensão instrumental. Essa vertente respeita ao(s) discurso(s), de cuja excelência depende o alcance e o impacto da divulgação pretendida. Só a qualidade do(s) discurso(s), ancorada na convergência da criatividade com o domínio das técnicas e das linguagens, permitirá, com efeito, prosseguir a estratégia de internacionalização consequente dos objectivos delineados [2]”.


Afirmava-se seguidamente:


“Na mesma linha de pensamento importa reconhecer o Porto 2001 - Capital Europeia da Cultura como potencial e, porventura, decisivo agente de mudança da paisagem audiovisual e multimédia local e regional, tendo em conta não apenas as capacidades de produção instaladas, mas também os saberes dispersos pelos diversos protagonistas, sejam eles da área empresarial, pública ou privada, ou das áreas dos festivais e da universidade. A mudança pretendida, no sentido de conferir maior e melhor presença à globalidade do sector, se recusa qualquer prática de intervencionismo, aliás, ilegítima, nem por isso deixa de exigir, da parte Sociedade Porto 2001, a capacidade de lançar um conjunto de desafios nos quais os potenciais parceiros da Capital Europeia da Cultura possam encontrar motivos mobilizadores [3]”.


Desenho de Abi Feijó e Regina Pessoa para o storyboard do genérico da Odisseia nas Imagens

Do exposto resultavam alguns pressupostos e outras tantas intenções de cuja articulação era previsível chegar a uma malha coerente de programação. Assim, a aposta na excelência do discurso impunha critérios rigorosos em relação àquilo que se pretendia dar a ver, sendo que o dar a ver teria de corresponder a opções de ordem estratégica alicerçadas num intuito fundador de promover a criação de novos públicos, dos quais, por sua vez, era suposto poderem sair novos agentes culturais com intervenção, nomeadamente no plano da produção e, logo, com impacto no tecido empresarial da indústria audiovisual. Por outro lado, as opções de ordem estratégica teriam sempre de ser definidas em função das capacidades instaladas e dos saberes existentes valorizando, portanto, os festivais, as universidades e o Centro de Produção do Porto da RTP.


Contudo, a par da lógica de reforço do trabalho desenvolvido, haveria também que conferir sentido prospectivo à programação procurando identificar um território de novas apostas fosse em termos das linguagens transversais, fosse no domínio de modalidades discursivas e narrativas, como o documentário, cujas características pareciam adequadas a um investimento de reprodutibilidade previsível a médio prazo. Tratava-se, em suma, de acertar o passo com novos e velhos desafios numa perspectiva de envolvimento e desenvolvimento de parcerias criativas, o que só poderia ser feito no quadro de uma programação de alta qualidade, deliberadamente interpelativa e, por isso mesmo, obrigada a acautelar os aspectos lúdicos e conviviais sem os quais correria o risco de se encerrar num anacrónico espaço de especialistas voltados sobre si mesmos.


Como corolário resultava que “da aceitação desses desafios, bem como do percurso que cada qual for capaz de fazer, construindo pontes entre o público e o privado, entre as empresas e a Universidade, entre o mercado nacional e o mercado internacional, é suposto surgir algo de qualitativamente diferente a ponto de tornar a cidade num porto de acolhimento de eventos e criadores, cujo horizonte temporal se pretende projectar para além de 2001 [4]”.


Rascunho de Abi Feijó e Regina Pessoa para o storyboard para o genérico da Odisseia nas Imagens

Em função deste enquadramento o passo seguinte iria no sentido de desencadear as iniciativas preliminares que permitissem montar a logística indispensável à concretização dos objectivos propostos. Desde logo, numa primeira fase, estabelecer contactos tendo em vista a criação de parcerias estratégicas com a RTP, com os estabelecimentos de ensino superior da área metropolitana do Porto e com os festivais de cinema.


No primeiro caso, tratava-se, por um lado, de propor um tipo de intervenção que de algum modo pudesse reflectir uma proposta de reorientação estratégica do serviço público de televisão de âmbito regional privilegiando os aspectos de regulação da paisagem audiovisual numa perspectiva de descentralização, e de assegurar, por outro lado, a cobertura televisiva da Programação e actividades da Capital Europeia da Cultura, sendo que estas duas vertentes deveriam ser articuladas de modo a possibilitar o aparecimento de conteúdos qualitativamente diferentes.


No segundo caso, tratava-se de envolver as universidades para efeito da criação de novos públicos encarados como potenciais geradores de criadores e agentes culturais, sendo que este envolvimento de professores e estudantes deveria obedecer à perspectiva de os familiarizar com as áreas simbólicas de interesse estratégico fazendo deles, simultaneamente, actores de um processo de transformação que deveria passar pela sua participação em acções de formação e de produção audiovisual e multimédia no âmbito dos respectivos cursos.


Finalmente, quanto aos festivais tratava-se de os integrar na Programação oficial da Capital da Cultura como elemento de valorização procurando, simultaneamente, promover novas sinergias. Aliás, as primeiras opções quanto àquilo em que valeria a pena apostar iam no sentido do reconhecimento do trabalho por eles efectuado ao longo dos anos, nomeadamente no domínio das curtas metragens e do cinema de animação. O documentário viria logo a seguir, constituindo-se como paradigma do que valeria a pena divulgar e produzir.  


A opção pelo documentário obedeceu a critérios de vária ordem [5]. Tratando-se de algo se não proscrito pelo menos relativamente marginal em termos de produção e distribuição cinematográfica pareceu oportuno recuperá-lo e dá-lo a conhecer na amplitude das suas modalidades e numa perspectiva de poder vir a interessar novos públicos e futuros criadores. Tanto mais que graças à televisão – e apesar dela – o documentário atravessava uma fase de rápido desenvolvimento com expressão no número de festivais existentes e nos níveis de produção dos países da União Europeia, com destaque para o Reino Unido. Por outro lado, não exigindo meios avultados e sendo uma espécie de álbum de família dos povos, como lhe chamou Patrício Guzmán, o documentário poderia transformar-se num meio privilegiado de dar a conhecer a cidade. A prazo, à semelhança do que já estava a acontecer com Barcelona, o Porto poderia vir a ser a capital do documentário em Portugal, com todas as vantagens daí decorrentes no domínio das infraestruturas produtivas e das superestruturas da credibilidade e da visibilidade.


Performance de Arnaldo Antunes, exemplo de transversalidade de linguagens na Odisseia nas Imagens. Foto: Cesário Alves

Esta ideia era reforçada em função de tendências identificadas no quadro audiovisual europeu:


“Essas tendências apontam para uma produção genuinamente europeia, no âmbito da qual se verifica a revalorização do local e do regional entendidos como base do universal. No plano simbólico, faz-se, portanto, a defesa da visibilidade das diferentes parcelas do conjunto da União Europeia. Esta unidade na diferença é reforçada e estimulada pelo facto das tecnologias da informação e da comunicação, em particular o digital, terem pulverizado o universo televisivo generalista, dando lugar a uma televisão temática, segmentada e especializada. Trata-se de uma mudança radical, pois não apenas se subverte o quadro de difusão tradicional, mas também se induz uma verdadeira revolução no plano das linguagens [6]”.


Nesta perspectiva, o espaço documentário nas suas sempre complicadas relações com a televisão, uma vez ultrapassada a fase histórica do domínio do modelo generalista, deveria merecer um novo enfoque. Como é sabido, num primeiro momento, o documentário teve largo acolhimento no meio televisivo. Posteriormente, porém, a ditadura das audiências levou à imposição de formatos condicionadores da liberdade de criação e, nalguns casos, afastou-o, quando não o baniu da programação. Subsistiram, de modo mais ou menos generalizado, sequelas desse processo, cuja principal consequência no plano da linguagem foi a desvalorização da lógica das imagens a favor do primado da palavra, de algum modo à semelhança daquilo que levou René Clair a comparar algumas fitas da época do advento do cinema sonoro a um gramofone com ilustrações. Algumas experiências televisivas viriam, no entanto, a revelar-se interessantes, sobretudo porque, dirigindo-se ao grande público, não só mantiveram padrões elevados em termos artísticos, mas também se revelaram de indubitável interesse informativo, formativo e pedagógico.


Albert Maysies, ícone do Cinema Direto e um dos grandes documentaristas contemporâneos, outra presença na Porto 2001/Odisseia nas Imagens. Fonte: Vulture

A par desta constatação foram igualmente levadas em conta as previsíveis consequências da revolução digital, bem como da segmentação e especialização da oferta televisiva, elementos a considerar para efeito de pensar o documentário. Tal como acontecera com os formatos de eficácia reconhecida, devido ao aumento da procura e da exigência de parâmetros qualitativos mais elevados ao nível dos canais culturais e temáticos, parecia legítimo admitir a possibilidade de abrir uma janela de oportunidades para o reaparecimento de tendências – que pareciam perdidas – orientadas para recuperação do primado da aventura do olhar, recuperando, portanto, a tradição do cinema do real.    


Assim sendo, e reconhecendo no cinema a matriz essencial do documentário estabeleceu-se uma nova parceria estratégica, desta vez, com a Cinemateca Portuguesa, da qual viria a resultar o elo mais forte da Odisseia nas Imagens, o ciclo O Olhar de Ulisses [7].  


Notas remissivas

[1] . Anexo III – pp. 15-23. [2] . Anexo III – p. 17. [3] . ibid. [4] . ibid. [5] . A maioria da razões para a opção pelo documentário encontram-se já enunciadas na Introdução. Ver Anexo III – pp. 46-49. - Nota do Autor. [6] . Anexo III – p. 19. [7] . Anexo III – p. 44




Parcerias e áreas de intervenção estratégica


No último trimestre de 1999 estavam identificados os pilares estratégicos da Programação. Era ponto assente que a Odisseia nas Imagens deveria ser construída em torno de um evento pluridisciplinar de carácter estruturante e de longa duração, distribuído por locais tão diversificados quanto possível por forma a ir ao encontro das pessoas – embora os seus eventos mais emblemáticos devessem ter sede fixa [1] –, e numa perspectiva de work in progress. Dado o seu carácter experimental pareceu ser esse o método mais eficaz de enquadrar os ensinamentos respeitantes a cada módulo ou iniciativa por forma a produzir alterações nos módulos ou iniciativas seguintes, permitindo, se necessário, introduzir novas variáveis e inflexões de percurso em função dos resultados alcançados e da experiência adquirida.


Havia igualmente a previsão desse evento ser organizado em cinco módulos [2], os quais por sua vez se desdobrariam em ciclos e iniciativas complementares, beneficiando do apoio da Cinemateca Portuguesa [3] e das parcerias com iniciativas consolidadas como o Fantasporto [4], o Festival Internacional de Curtas Metragens de Vila do Conde e o Cinanima, as quais asseguravam à partida não só uma programação diversificada e dirigida a diferentes públicos, mas também a extensão de parte dessa mesma programação a outros municípios da área metropolitana do Porto [5].


Foi igualmente negociado o apoio do Instituto do Cinema, Audiovisual e Multimédia (ICAM), organismo dependente do Ministério da Cultura, para efeito da promoção e divulgação das encomendas da Porto 2001 em festivais internacionais. Finalmente, partiu-se para uma segunda linha de parcerias e acordos complementares, nomeadamente com o Instituto Francês do Porto, Goethe Institut, Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS) de Paris e Festival du Scoop et du Journalisme de Angers e Faculdade de Ciências da Comunicação da Universidade de Santiago de Compostela cuja importância viria a revelar-se determinante para a concretização e relevância de um número significativo de eventos [6].



Na presença do quadro descrito chegou-se, portanto, a uma malha conceptual que apontava para uma lógica de Programação cujas prioridades davam, resumidamente, acolhimento ao seguinte:


- identificação do que promover como modalidades discursivas estratégicas em função das capacidades instaladas e saberes existentes;

- criação de novos públicos em função dessas mesmas modalidades e em articulação com uma forte componente de formação traduzida, quer na realização de workshops, quer no estabelecimento de protocolos com estabelecimentos de ensino superior e com os festivais de cinema;

- aposta na excelência do discurso;  

- participação da RTP tendo em vista o seu papel regulador;

- alargamento da Programação à área metropolitana do Porto através da integração de algumas dessas iniciativas na Odisseia nas Imagens;

- aceitação de projectos externos desde que compatíveis com o orçamento disponível no quadro de prioridades definido;

- estabelecimento de parcerias ajustadas ao modelo de Programação adoptado;

- lançamento de bases para uma redefinição da paisagem audiovisual da cidade e da sua área metropolitana abrindo janelas de oportunidade para futuras associações, empresas e criadores;

- desenvolvimento de estratégias de internacionalização adequadas à conquista de um espaço de afirmação da cidade do Porto no audiovisual do noroeste peninsular.


As preocupações respeitantes à internacionalização foram equacionadas procurando estabelecer desde logo relações com a cidade de Roterdão. A Capital da Cultura pensada pela cidade holandesa obedecia, no entanto, a parâmetros muito diferentes. Enquanto no Porto a prioridade era lançar um conjunto de iniciativas estruturantes de modo a gerar dinâmicas culturais inovadoras, nomeadamente através do fomento de novos equipamentos como a Casa da Música e o melhoramento de outros já existentes, em Roterdão, uma cidade culturalmente bem equipada, as linhas gerais da programação obedeciam a critérios, sobretudo de carácter civilizacional, ocupando o multiculturalismo um lugar dominante.


Em todo o caso, foram estabelecidos contactos com produtores holandeses tendo em vista a co-produção de filmes e de programas de televisão. Em relação a estes últimos, devido aos custos elevados e à dificuldade em encontrar parceiros entre os operadores de televisão a hipótese foi rapidamente descartada. Em relação ao cinema, porém, foi estabelecido um acordo tendo em vista retomar uma série de sucesso denominada City Life e, nessa medida, acertar a produção de oito filmes de jovens realizadores sobre as cidades do Porto e de Roterdão assegurando, em simultâneo, a sua estreia mundial conjunta no Rotterdam International Film Festival, um dos mais importantes da Europa, no dia de abertura da Capital Europeia da Cultura holandesa [7].



Concomitantemente, beneficiando da experiência dos festivais da área metropolitana do Porto, casos do Cinanima e, sobretudo, do Festival Internacional de Curtas Metragens de Vila do Conde, outros contactos foram estabelecidos tendo em vista a possibilidade de colaborações mais alargadas no âmbito da Odisseia nas Imagens. Esses contactos foram relevantes para a programação da área multimédia, território de experimentação de novas linguagens e um pólo de interesse prioritário do universo escolar.


Identificadas as principais parcerias, lançado o concurso de projectos e estabelecidas as prioridades em função da estratégia delineada entendeu-se que a Programação deveria ser entendida como um percurso, cujo itinerário poderia ser alterado, inflectido ou rectificado consoante as necessidades criadas pela sua própria circunstância, de modo a:


a) Proporcionar uma Programação de grande qualidade e elevado grau de exigência

b) com vista a abrir caminho à concretização dos objectivos estrategicamente delineados

c) procurando valorizar a componente formativa,

d) mas sem descurar a dimensão lúdica e espectacular,

e) de modo a fidelizar públicos para modalidades discursivas alternativas ajustadas a uma política de nichos de mercado

f) de cuja afirmação pudesses resultar uma nova dinâmica produtiva para o Porto, conferindo um sentido prospectivo à sua tradição e memória de Cidade de Imagens,

g) numa perspectiva de internacionalização.


Para que esta lógica pudesse produzir resultados entendeu-se dar início à Odisseia nas Imagens ainda durante o ano de 2000.


Work in Progress


Por razões de urgência a primeira parceria concretizada foi com a RTP. Tratava-se da possibilidade de poder beneficiar em tempo útil de fundos comunitários do INTEREG e de começar a delinear o protocolo entre a Sociedade Porto 2001 e a RTP [8] na base dos pressupostos enunciados. Quanto aos fundos comunitários a Sociedade Porto 2001 diligenciou junto de Santiago de Compostela, Capital da Cultura em 1999 e de Salamanca, Capital da Cultura em 2002, no sentido de estabelecer um acordo visando dar passos para o estabelecimento de uma plataforma audiovisual do noroeste peninsular. Nesse sentido, houve uma consulta prévia à Comissão de Coordenação da Região Norte, a qual disponibilizou informações sobre os fundos disponíveis, alertando, no entanto, para constrangimentos decorrentes de prazos muito apertados para a formulação de candidaturas.


D: Fuse, Progressive Mix Session 1.0. Transversalidade e experimentação na Odisseia nas Imagens. Foto: Cesário Alves

Estes constrangimentos inviabilizaram à partida a participação de Salamanca, na altura ainda numa fase muito embrionário da preparação da sua Capital da Cultura, mas não impediram a manifestação da vontade de avançar por parte dos outros parceiros. A Sociedade Porto 2001 apresentou então o esboço de uma proposta designada Televisões Periféricas no Mercado Global [9]. Pretendia-se, fundamentalmente, dar um primeiro passo no sentido da cooperação entre os operadores de televisão de serviço público de Portugal e da Galiza, de modo a envolver ambas as capitais da cultura e a beneficiar da presença das universidades do Porto e de Santiago de Compostela. A componente universitária deveria permitir levar a cabo estudos em função dos quais fosse possível identificar os contornos de um mercado audiovisual comum ao norte de Portugal e da Galiza e fazer opções em matéria de co-produções. O projecto deveria ser financiado por fundos europeus. O prazo para a apresentação da candidatura, efectivamente muito apertado, viria, no entanto, a expirar antes do processo poder ser concluído [10].


Contudo, alguns dos pressupostos subjacentes à elaboração da proposta respeitante às Televisões Periféricas no Mercado Global viriam a ser integrados tanto no primeiro quanto no segundo protocolos assinados com a RTP. Esses pressupostos resultavam da tentativa de identificar o lugar de uma cidade de dimensão média como o Porto no contexto da produção audiovisual europeia. Procurou-se relevar o papel regulador do serviço público de Televisão enquanto instrumento de políticas para o audiovisual, nomeadamente no âmbito da produção e distribuição de conteúdos. O regional, elemento de diferenciação no mercado global, surgia associado à identificação de nichos de mercado a partir dos quais poderia pensar-se em produções especializadas.


Seguindo a mesma linha de orientação o protocolo contemplava o acolhimento de iniciativas da responsabilidade da RTP como o MAT (Mostra Atlântica de Televisão) e a reunião anual do CIRCOM, organismo representativo de cerca de 400 televisões de serviço público de âmbito regional. Estas iniciativas seriam palco de mostras nas áreas do documentário, da grande reportagem e de outros formatos televisivos, bem como de seminários e conferências com enfoque em tendências do audiovisual europeu centradas no local e regional [11].


Paralelamente decorreram negociações com os cursos do ensino superior do Porto tendo em vista a sua integração e participação na Odisseia nas Imagens na linha dos pressupostos enunciados em documentos preliminares:


“A Universidade tem vindo a desenvolver cursos de Jornalismo, Comunicação Social, Multimédia e Imagem e Som. Passa, por outro lado, por uma fase crucial: a dotação plena de tecnologias da informação, da qual não se ausenta a necessidade de afirmação na sociedade da comunicação. A este nível, é gritante, por exemplo, a precariedade das intervenções em suportes próprios e da responsabilidade da própria Universidade e dos seus diversos actores. Nesse sentido, o Porto 2001 pretende lançar o desafio de articular os cursos existentes com iniciativas exteriores à Universidade. Essas iniciativas poderão conhecer diversos rumos, sejam eles do domínio da formação ou da produção de conteúdos, da divulgação ou da pesquisa, mas, em todo caso, serão sempre iniciativas orientadas em termos do reforço da ligação ao meio, por um lado, e de reforço das próprias estruturas universitárias em matéria de audiovisual e multimédia [12]”.


O universo dos estudantes universitários seria, assim, o alvo natural para efeito da criação de novos públicos, bem como o núcleo a partir do qual deveriam gerar-se dinâmicas de criação e de produção em torno das modalidades de relevância estratégica: o documentário, as curtas metragens de ficção e o cinema de animação, sem prejuízo de incursões noutros domínios [13]. Por essas razões os protocolos assinados com as universidades [14] contemplavam a integração da Odisseia nas Imagens nos planos curriculares dos respectivos cursos, comprometendo-se a Sociedade Porto 2001 a reservar uma percentagem da lotação das salas, consoante a sua capacidade, para estudantes devidamente credenciados.


Por outro lado, as escolas deveriam fomentar a produção escolar destinada a ter visibilidade pública num festival competitivo com o qual se encerraria, no plano simbólico, a opção estratégica feita pela Sociedade Porto 2001 na área audiovisual e multimédia. Essa produção seria parcialmente financiada pela Capital Europeia da Cultura no pressuposto de que as verbas atribuídas seriam investidas em know how e infraestruturas.


Se as parcerias com a RTP, com os festivais e com as universidades resultaram da iniciativa da Sociedade Porto 2001 outras poderiam resultar da iniciativa da sociedade civil na sequência da abertura de um período para aceitação de projectos externos, os quais seriam avaliados em função da sua compatibilidade com a lógica global da Capital Europeia da Cultura e das opções estratégicas definidas pela área do Cinema, Audiovisual e Multimédia.


Marceline Loridan-Ivens, viúva de Joris Ivens (à esquerda na imagem), protagonista de filmes incontornáveis como Chronique d'un Été de Jean Rouch e Edgar Morin. A cineasta marcou também presença no ciclo O Olhar de Ulisses da Odisseia nas Imagens

Notas remissivas

[1] . As iniciativas da Odisseia nas Imagens realizaram-se nos seguintes 32 Espaços: Associação Os Filhos de Lumiére; Auditório Municipal de Vila do Conde; Bar Labirintho; Bar Trintaeum; Bar Voice; Biblioteca Almeida Garrett; Casa das Artes; Casa Tait; Centro Multimeios de Espinho; Cinema Trindade; Coliseu do Porto; Escola Superior Artística do Porto; Escola Superior de Artes e Design; Escola Superior de Jornalismo do Porto; Estação de S. Bento; Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto; Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto; Filmógrafo; Fnac; Fundação de Serralves; Galeria Artes em Partes; Hard Club; Instituto Nacional de Engenharia de Sistemas e Computação; Moagens Harmonia; Porto Palácio Hotel; Rivoli Teatro Municipal; RTP Porto; Teatro do Campo Alegre; Universidade Católica do Porto; Universidade do Minho; Universidade Fernando Pessoa; Universidade Popular do Porto. - Relatório de Avaliação Final do Departamento de Cinema Audiovisual e Multimédia da Sociedade Porto 2001 – Capital Europeia da Cultura, sem páginas numeradas. [2] . Na verdade, a previsão pecou por excesso de optimismo e logo após o primeiro módulo da Odisseia nas Imagens se constatou a impossibilidade, por razões de vária ordem, de concretizar os cinco módulos, que passaram a quatro. – Nota do Autor. [3] . Ver Anexo III – p. 44. O Protocolo assinado com a Cinemateca Portuguesa tinha fundamentalmente o objectivo de beneficiar da sua larga experiência para efeito da Programação de Cinema, nomeadamente no respeitante aos ciclos respeitantes do filme documentário. Previa ainda a cedência de filmes, textos e fotos para catálogos, intercâmbio com outras Cinematecas e apoio em matéria de relações internacionais. Outro objectivo era lançar as bases para uma programação regular da Cinemateca Portuguesa no Porto. – Nota do Autor. [4] . Ver Anexo III – pp. 42-43. O protocolo com o Fantasporto foi o mais difícil de concretizar. Em causa, para além de desencontros em termos das contrapartidas financeiras desejadas pelo festival, parece ter pesado o clima de tensão, entretanto criado entre a Sociedade Porto 2001 e o Ministério da Cultura, cujo titular da altura, Manuel Maria Carrilho, sempre demonstrou apreço pelo papel desempenhado pelo Fantasporto. Nos jornais surgiam sistematicamente notícias sugerindo a incapacidade da Sociedade Porto 2001 para dar corpo a uma programação, chegando mesmo a aventar-se a hipótese de remodelação dos programadores. Após a audição destes por parte de uma comissão parlamentar, a partir da qual se ficou com uma ideia mais precisa dos objectivos da Programação Cultural, o Fantasporto diria ter havido até então um défice de comunicação e daria o contencioso por encerrado. - Nota do Autor. [5] . Ver Anexo III – pp. 18-19. Os protocolos assinados com os Festivais de Cinema do Porto e da sua área metropolitana tinham fundamentalmente os seguintes objectivos: - Cinanima - Reforçar o Cinanima como corolário da aposta estratégica da Porto 2001 no Cinema de Animação. Integrar o Cinanima na Programação da Odisseia nas Imagens. Apoiar a edição em livro e CD-ROM da História da Animação em Portugal no âmbito das comemorações dos 25 anos do Festival. Promover ciclos em articulação com a Odisseia nas Imagens: Cinema de Animação e Arte e Cinema de Animação e Música. Atribuir um Prémio Porto 2001 para o melhor filme de animação em português em competição na 25ª edição do Cinanima. Aproveitar o Cinanima para promover e divulgar a Odisseia nas Imagens junto dos seus convidados. - Fantasporto - Promover a abertura em conjunto do Fantasporto 2001 e da Odisseia nas Imagens no dia 17 de Fevereiro de 2001, no Coliseu do Porto, com a execução da Sinfonia Fantástica de Berlioz pela Orquestra Nacional do Porto, sob a direcção do Maestro Frédéric Chaslan. Integrar o Fantasporto na Programação oficial da Capital Europeia da Cultura. Atribuir um Prémio “Porto 2001” para a melhor longa metragem portuguesa estreada em 2000. Estrear no Fantasporto os filmes da série City Life (designação posteriormente alterada para Estórias De Duas Cidades). Aproveitar o Fantasporto para a promoção e divulgação da Capital Europeia da Cultura. - Festival Internacional de Curtas Metragens de Vila do Conde - Reforçar o FICMVC em função da aposta estratégica da Sociedade Porto 2001 nas curtas metragens de ficção. Apoiar a realização do Ciclo 15X15: A Herança Cinematográfica Europeia. Patrocinar a realização de O Nosso Século em Curtas, em Julho de 2000, no Teatro Rivoli (extensão do 8º. Festival Internacional de Curtas Metragens de Vila do Conde). Atribuir um Prémio Porto 2001 para a melhor curta metragem portuguesa em competição no 9º. Festival Internacional de Curtas Metragens de Vila do Conde. Integrar na Odisseia nas Imagens o Filme Concerto sobre filmes de Charles Bowers. Aproveitar o Festival de Vila do Conde para efeito de promoção e divulgação da Odisseia nas Imagens. - Nota do Autor. [6] . Basicamente os acordos estabelecidos tinham a ver com o seguinte: - Instituto Francês do Porto, para efeito de cooperação cultural e apoio a viagens e estadias; - Goethe Institut, para efeito de cooperação cultural e apoio a viagens e estadias; - Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS – Images/Media) de Paris, para efeito de programação do ciclo O Olhar de Ulisses e lançamento de bases de cooperação com a Universidade do Porto; - Festival du Scoop et du Journalisme de Angers, para efeito de participação no ciclo Como Salvar o Capitalismo/ Outras Paisagens ; - Faculdade de Ciências da Comunicação da Universidade de Santiago de Compostela, para efeito de programação do módulo Apocalípticos e Integrados e do ciclo Como Salvar o Capitalismo/ Outras Paisagens através de Margarida Ledo Andión e da participação de estudantes com filmes a concurso na competição de escolas da Odisseia nas Imagens. - Nota do Autor. [7] . Anexo III – p. 41. [8] . Na verdade, viriam a ser assinados dois protocolos com a RTP. O primeiro ainda no tempo de Artur Santos Silva à frente da Sociedade Porto 2001 e de Brandão de Brito enquanto presidente do Conselho de Administração da RTP. Desse primeiro protocolo é dada conta no Anexo III – p. 32. O segundo foi assinado bastante mais tarde, já com Teresa Lago e durante a vigência do mandato de José Carlos Silva à frente do operador de serviço público. Este segundo protocolo viria a substituir o primeiro, o qual, por razões mal esclarecidas, parece ter sido negligenciado por parte de elementos da Direcção da RTP a ponto de a SIC se colocar na posição de poder vir a ser reconhecida como televisão oficial da Capital Europeia da Cultura. A intervenção do presidente do Conselho de Administração da RTP João Carlos Silva, bem como da tutela, terá inviabilizado esse intuito. - Nota do Autor. [9] . Anexo III – pp. 35-38. [10] . Também neste caso a RTP optou por uma posição expectante. A televisão da Galiza, pelo contrário, chegou a designar pessoas e disponibilizar verbas para a concretização da candidatura às verbas do INTEREG. - Nota do Autor. [11] . Além do acolhimento na Odisseia nas Imagens do MAT e do CIRCOM a RTP comprometia-se à comparticipação na série de curtas metragens City Life, designação posteriormente alterada para Estórias de Duas Cidades, bem como na realização de programas e reportagens sobre o dia a dia da Capital Europeia da Cultura . - Nota do Autor. [12] . Anexo III – p. 18. [13] . Os protocolos assinados com os estabelecimentos de ensino superior tinham fundamentalmente os seguintes objectivos: - Universidade Católica - Criação de uma Pós-Graduação em Realização Televisiva, com especialização em Documentário e Curtas Metragens de Ficção. Produção e realização de 10 documentários de 26’ 00” e de 10 curtas metragens de ficção. Integração da Programação da Odisseia nas Imagens no plano curricular da Pós-Graduação em Realização Televisiva. Criação de novos públicos. - Universidade Fernando Pessoa - Integração da Odisseia nas Imagens no plano curricular do Curso Superior de Ciências da Comunicação e da Informação, na área de Televisão. Produção e Realização de 2 documentários e de 4 grandes reportagens com a duração de 26’ 00’’. Criação de novos públicos. - Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto - Integração da Odisseia nas Imagens nos objectivos programáticos das disciplinas de Cine-Vídeo e Desenho Gráfico. Produção de 6 obras de vídeo arte, 6 obras multimédia e 6 projectos multimédia de arte pública. Produção e Realização do documentário “O puzzle volta ao Porto” de Hugo Miguel Vieira da Silva. Criação de novos públicos. - Escola Superior de Jornalismo do Porto - Assunção como objectivo primordial da actividade académica nos anos lectivos de 1999/2000 e 2000/2001 dos temas relativos ao Porto 2001, Capital Europeia da Cultura. Integração da Odisseia nas Imagens nos planos curriculares das disciplinas de Televisão e Imagens e Sons. Produção e Realização de 2 documentários e de 4 grandes reportagens de 26’ 00’’. Co-Produção com a Sociedade Porto 2001 e com a colaboração do Festival du Scoop et du Journalisme de Angers da competição de escolas da Odisseia nas Imagens. Criação de novos públicos. - Escola Superior Artística do Porto - Integração da Odisseia nas Imagens no plano curricular do Curso de Cine-Vídeo nos anos lectivos de 1999/2000 e 2000/2001. Produção e Realização de 9 documentários com duração de 26’ 00’’ a 30’ 00’’, 4 curtas metragens de ficção e 20 vídeos experimentais de 1’ 00’’. Desenvolvimento de acções de Formação: Realização de Documentários (por Malek Bensmail), Produção de Documentários sobre a Natureza (por Jan Arnold), Novas Tecnologias na Criação Audiovisual (por Joe Davidow), Argumento para Cinema e Televisão (por John Furia Jr.), Direcção de Fotografia (por Francisco Vidinha). Criação de novos públicos. - Nota do Autor. [14] . O primeiro protocolo foi assinado com a Universidade Católica do Porto e envolvia o seu Curso de Imagem e Som. A prioridade atribuída à Universidade Católica tinha a ver com o facto de ser, na altura, a instituição de Ensino Superior mais bem apetrechada para responder aos requisitos exigidos pela produção de filmes e à formação de pós-graduação. Ver Anexo I – pp. 3-4 e 9-13. - Nota do Autor.


Cinema (2001) de Fernando Lopes. Documentário comemorativo dos 100 anos do nascimento do Cinema em Portugal, no Porto, uma encomenda da Odisseia nas Imagens

Projectos, encomendas e acções de formação 


Foi recebida cerca de uma centena de propostas. Algumas dessas propostas viriam a merecer descriminação positiva. Entre elas, duas assumiam particular relevância: uma, da Produtora Filmógrafo, na área do cinema de animação, visando criar a Casa da Animação; outra, da Universidade do Minho, tendo por objectivo a constituição do Museu da Pessoa [1]. Projecto multimédia, o Museu da Pessoa seria um museu virtual para contar na Internet a história da cidade e dos seus lugares através de estórias de vida e de testemunhos de anónimos, mas explorando, simultaneamente, suportes tradicionais, como o livro e a televisão [2]. Quanto à Casa da Animação a proposta teve origem em elementos fundadores da produtora Filmógrafo, entre os quais o cineasta Abi Feijó, responsável por parte dos melhores filmes portugueses de animação realizados até à data, e envolvia um ambicioso conjunto de iniciativas [3]. Dirigido essencialmente aos públicos mais jovens, dele faziam parte, nomeadamente, retrospectivas dos Estúdios Aardman, de Ladislas Starevich e do cinema de animação canadiano, reposições de clássicos, estreias de filmes ausentes do circuito comercial português, visitas de estudo e diversos workshops orientados, entre outros, por criadores como Normand Roger e Jayne Pilling [4].  


A maioria dos projectos apresentados, porém, ou tinha orçamentos proibitivos ou não se enquadrava nas linhas gerais delineadas para a Odisseia nas Imagens. Entre as propostas mais ambiciosas contavam-se algumas da área multimédia apresentadas pelo Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores do Porto (INESC) e pela Associação Portucale XXI, de relevância indiscutível [5], mas impossíveis de concretizar devido aos custos. A própria Casa da Animação, considerada prioritária e de interesse estratégico, foi objecto de aturadas negociações e reajustamentos, bem como do envolvimento do governo central e da autarquia, sem o qual teria sido impossível a sua concretização.


Sobre o filme escreveu Jacques Parsi: “Com a liberdade de inspiração e o rigor de escrita que o caracterizam, Manoel regressa à sua cidade natal, a cidade do Porto. Ela já tinha inspirado o seu primeiro filme, Douro Faina Fluvial, em 1931, e o filme que marca o seu regresso atrás da câmara em 1956, O Pintor e a Cidade. Nestas duas obras Oliveira havia filmado aquilo que prendia o seu olhar. Em Porto da Minha Infância, ele escolheu filmar aquilo que já não existe e que só os olhos da memória, da “sua” memória podem ainda ver. À imagem daquele primeiro plano onde uma orquestra invisível toca uma música misteriosa. O Porto da Minha Infância é ainda o Porto de antes do nascimento: uma cidade carregada de história, uma cidade de artistas e pensadores. E, como que por um movimento em espiral, o filme desenvolve-se desde as ruínas da sua casa natal, à cidade do Porto, a toda a sociedade onde se trava a guerra dos sexos, à Europa. O último plano do farol que se abre sobre o infinito do mar e do mundo é a réplica, ou a rima se se quiser, a cores, do primeiro plano do primeiro filme do jovem Oliveira, setenta anos antes... o Porto é também a cidade que viu nascer, depois de 1896, o cinema em Portugal [11]”

Feita a opção pelo documentário, as curtas metragens e o cinema de animação, uma opção consequente com a avaliação das capacidades instaladas e os saberes existentes e, como tal, susceptível de desenvolvimentos no futuro em termos de produções de excelência, é natural que as encomendas levadas a cabo se inscrevessem essencialmente nesse domínio e procurassem envolver, desde logo, o mais representativo cineasta português, Manoel de Oliveira, a quem foi proposto que revisitasse o Porto através de um filme documentário seguindo os passos de Douro, Faina Fluvial (1931).


Ao nome de Manoel de Oliveira está associada toda a história do cinema português e, em particular, a história do cinema feito no Porto, cuja memória a Odisseia das Imagens procuraria recuperar, conferindo-lhe sentido prospectivo. A encomenda, para além da homenagem ao cineasta, tinha o papel simbólico de representar o renascimento da produção do filme documentário feito a partir da cidade. O Porto da Minha Infância (2001) [6] seria, como foi, a obra de maior relevância produzida no âmbito da Programação de cinema. [7].


Das encomendas feitas pela Sociedade Porto 2001 destaca-se igualmente a já mencionada série City Life constituída por quatro curtas metragens de autores portugueses, inicialmente associadas a outras tantas de autores holandeses, num registo de cumplicidade de olhares cruzados sobre as duas cidades [8]. Estes filmes, pensados em função do impacto que poderiam ter em termos de promoção de ambas as Capitais Europeias da Cultura, deveriam fazer o percurso dos principais festivais europeus de cinema do ano 2001, bem como serem objecto de difusão televisiva nacional e internacional. A parte holandesa, porém, não cumpriu os objectivos, produzindo apenas dois filmes. Mesmo assim, os seis filmes estrearam em salas cheias no Festival de Roterdão. A partir daí os filmes portugueses ganharam autonomia sob a designação Estórias de Duas Cidades e os seus quatro filmes acabaram por justificar o investimento realizado, visto terem sido objecto de exibição em festivais de todo o mundo [9], com passagem em canais televisivos, nomeadamente na RTP. Estórias de Duas Cidades – integrando os filmes Distância (2001) de Pedro Serrazina, Acordar (2001) de Tiago Guedes / Frederico Serra, Corpo e Meio (2001) de Sandro Aguilar e Sereias (2001) de Paulo Rocha – abriram o Fantasporto em 21 de Fevereiro de 2001 [10].


Clip de Acordar (2001) de Tiago Guedes e Frederico Serra, uma encomenda da Odisseia nas Imagens para o projeto Estórias de Duas Cidades, elaborado em parceria com Roterdão.

Uma outra encomenda feita no sentido de evocar a memória cinéfila do Porto foi Cinema (2001) de Fernando Lopes, uma homenagem a Aurélio da Paz dos Reis. Pensado a partir de um poema de Carlos de Oliveira e com desenhos de Jorge Colombo este filme, bem recebido pela crítica, recupera a memória do pioneiro portuense das imagens em movimento em Portugal, mas transcende esse objectivo, situando-se no plano de uma liturgia sobre o próprio cinema. Exibido no Festival de Veneza e estreado em Portugal a 15 de Março de 2001 no ciclo O Olhar de Ulisses, o filme de Fernando Lopes contribuiu igualmente para projectar externamente a imagem da Capital Europeia da Cultura [12].


Foram ainda encomendas ou filmes apoiados pela Odisseia nas Imagens: Casa da Música (nunca exibido) de Pierre-Marie Goulet, Oresteia na Prisão (2001) de Saguenail e Regina Guimarães, Desassossêgo (2001) de Catarina Mourão, O Puzzle Volta ao Porto (2001) de Hugo Vieira da Silva e Novo Mundo (2001) de António, Jorge Neves e Pedro Abrunhosa. Com excepção de Novo Mundo, uma curta-metragem de animação, todos os restantes filmes são documentários.


Em simultâneo com a concretização das parcerias, encomendas e selecção de projectos desenvolveram-se os primeiros esforços no sentido de lançar um programa de acções de formação. Num primeiro documento enviado à Comissão Executiva da Sociedade Porto 2001, afirmava-se:

“Na União Europeia, o sector do audiovisual e multimédia é reconhecido como sendo dos mais interessantes do ponto de vista da criação de emprego. Por outro lado, dele depende a afirmação, no plano simbólico, das diversas realidades parcelares constituintes da realidade que é, hoje, a Europa. Elemento fundamental da promoção da visibilidade local e regional num contexto de internacionalização, o discurso, seja ele audiovisual ou multimédia, exige parâmetros de elevado nível [13]”.


Acrescentava-se em seguida:


“Tendo em conta a indispensabilidade de amplificar o efeito Porto - 2001, quer interna, quer externamente, e reconhecendo-se a necessidade de melhorar significativamente a capacidade discursiva existente, entende-se ser de todo o interesse avançar com acções de formação nas quais seja possível envolver tanto profissionais em exercício, quanto candidatos a um emprego. Essas acções deveriam envolver as empresas e as universidades, dentro de um espírito de articulação de saberes e na perspectiva de gerar sinergias fazendo convergir agentes frequentemente muito fechados sobre si próprios [14]”.



As acções de formação, levadas a cabo no âmbito de um programa negociado com o Instituto de Emprego e Formação Profissional, em colaboração com a Associação Empresarial de Portugal, acabariam por constituir-se num dos pólos de atracção da Odisseia nas Imagens. Distribuídas pelas áreas do cinema, televisão, jornalismo e multimédia realizaram-se 42 acções de formação [15], para as quais se inscreveram cerca de 1.100 candidatos, número muito superior ao número de vagas existentes [16]. Devido à procura, dentro de um quadro de razoabilidade, foi alargado o limite de inscrições de um número significativo de workshops, embora, noutros casos, tal não tenha sido possível dadas as características das acções de formação e dos respectivos destinatários. No total, até ao encerramento da actividade da Odisseia nas Imagens tiveram formação 440 candidatos seleccionados em áreas tão diversificadas quanto o cinema, a televisão, o cinema de animação e o multimédia [17].  


Como se depreende, todas as encomendas, projectos externos e acções de formação destinavam-se a integrar articulada e corentemente os diferentes módulos da Programação. Dois exemplos: por razões simbólicas, e dada a relevância atribuída ao documentário, o filme de Manoel de Oliveira destinava-se a abrir oficialmente o I Festival Odisseia nas Imagens integrado no módulo Como Salvar o Capitalismo/ Outras Paisagens; as acções de formação complementavam ciclos de cinema ou iniciativas multimédia no âmbito do aprofundamente das relações com o público escolar e universitário


Notas remissivas

[1] .  O protocolo assinado com a Universidade do Minho tinha fundamentalmente os seguintes objectivos: Instalação do Museu da Pessoa de Portugal através do Grupo de Especificação e Processamento de Linguagens do Departamento de Informática da Universidade do Minho. Integração da Odisseia nas Imagens em iniciativas do Departamento de Comunicação Social da Universidade do Minho. Produção e Realização de 4 documentários de 26’ 00’’ no âmbito das recolhas de Histórias de Vida para o Museu da Pessoa. Criação de novos públicos. - Nota do Autor. [2] . Na verdade, o protocolo respeitante ao Museu da Pessoa foi desdobrado em três de modo a dar acolhimento a nova parcerias com a Universidade Popular do Porto e o Museu da Pessoa de São Paulo. Basicamente, a Universidade do Minho seria a entidade tomadora, competindo-lhe a abertura do site do Museu da Pessoa. À Universidade Popular do Porto cabia abrir o site Memórias do Trabalho, desenvolvendo, para o efeito, as acções de formação correlativas. Quanto ao museu da Pessoa de São Paulo, entidade pioneira com experiência adquirida no domínio da democratização da memória, teria por função fornecer orientação através de workshops. - Nota do Autor. [3] . O protocolo assinado com a Associação Casa da Animação visava essencialmente o seguinte: Instalação no Porto de uma infraestrutura de nível consonante com a produção de cinema de animação já existente no Porto, incluindo um núcleo de projectos na área da formação e programação para jovens e público em geral, videoteca, biblioteca e outras valências; dinamização de práticas de profissionalização interna ao cinema de animação; programação para o ano de 2001 integrada na Odisseia nas Imagens com o melhor da actualidade nesta área; acções de Formação em 2001; criação de novos públicos. - Nota do Autor. [4] . Para além da inclusão do Cinanima na programação oficial o conjunto de iniciativas da Casa da Animação revelar-se-ia um dos pontos fortes da Odisseia nas Imagens. Ver, por exemplo, o Anexo I – pp. 71-72, pp. 146-149, pp.156-159, pp. 258-259, pp. 261- 268. - Nota do Autor. [5] . Ver Anexo III – pp. 20-23 [6] . Anexo I – pp. 191-192 e pp.291-295. [7] . Produzido por Paulo Branco, este filme teve desde logo um momento de consagração quando da estreia mundial no Festival de Veneza onde foi exibido perante um público de mais de 1500 pessoas que apladiu de pé, durante sete minutos, Manoel de Oliveira. Da comitiva Portuguesa ao Festival de Veneza faziam parte, nomeadamente o Ministro da Cultura Augusto Santos Silva e o Director da Cinemateca Nacional João Bénard da Costa. O facto de O Porto da Minha Infância ser uma encomenda da Sociedade Porto 2001 muito contribuiu para a projecção da Capital Europeia da Cultura. Posteriormente, todas as exibições deste filme em Portugal constituíram um enorme êxito, nomeadamente a ante-estreia nacional na abertura oficial do módulo 4.0 da Odisseia nas Imagens. A crítica, por seu turno, considerou o filme uma obra prima. 70 anos depois de Douro, Faina Fluvial, o Porto passava a dispor de outro monumento iconográfico sem paralelo na História do Filme Documentário Português. - Nota do Autor [8] . Anexo III – p. 41. [9] . Estórias de Duas Cidades foram pensadas não apenas em termos do incentivo à produção de curtas metragens, mas também como factor de promoção e divulgação da cidade do Porto. Tiveram ampla divulgação - passaram em 26 Festivais na Europa e na América - o que permitiu projectar e promover o Cinema Português. Para isso contribuiu também o facto de alguns dos filmes terem sido premiados ou distinguidos em Festivais Internacionais. O seu percurso pode ser observado no Anexo I – pp. 69-70. - Nota do Autor [10] . Anexo I – pp. 76-79. [11] . Anexo I – p. 191. [12] . Anexo I – pp.113-114. [13] . Anexo III – pp. 53-54. [14] . ibid. [15] . As acções de formação encontram-se explicitadas ao longo do Anexo I. - Nota do Autor. [16] . Relatório de Avaliação Final do Departamento de Cinema Audiovisual e Multimédia da Sociedade Porto 2001 – Capital Europeia da Cultura, sem páginas numeradas. [17] . ibid.






(Continua)



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Jorge Campos

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Imagens do Real Imaginado (IRI) do Instituto Politécnico do Porto foi o ponto de partida para o primeiro Mestrado em Fotografia e Cinema Documental criado em Portugal. Teve início em 2006. A temática foi O Mundo. Inspirado no exemplo da Odisseia nas Imagens do Porto 2001-Capital Europeia da Cultura estabeleceu numerosas parcerias, designadamente com os departamentos culturais das embaixadas francesa e alemã, festivais e diversas universidades estrangeiras. Fiz o IRI durante 10 anos contando sempre com a colaboração de excelentes colegas. Neste segmento da Programação cabe outro tipo de iniciativas, referências aos meus filmes, conferências e outras participações. Sem preocupações cronológicas. A Odisseia na Imagens, pela sua dimensão, tem uma caixa autónoma.

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