top of page
8811.jpg
   viagem pelas imagens e palavras do      quotidiano

NDR

  • Foto do escritor: Jorge Campos
    Jorge Campos
  • 23 de set. de 2022
  • 13 min de leitura


Edward R. Murrow no estúdio de See It Now

Anyone who isn’t confused really doesn’t understand the situation
Edward R. Murrow

Não há nenhum jornalista no mundo sobre quem tenham recaído tanto as atenções quanto Edward R. Murrow. O seu trabalho, para a Rádio a partir de 1937 e para a Televisão dez anos mais tarde, tornou-se a referência para o que viriam a ser as notícias em ambos os media. Este texto põe o foco naquela que foi a sua batalha mais dura, uma batalha travada em nome da democracia, pela liberdade de expressão. Numa América dominada pelo medo da “caça às bruxas” levada a cabo pelo senador republicano Joseph McCarthy, Murrow teve a coragem de o enfrentar. Venceu. Mas a queda de McCarthy foi também o início da sua própria queda enquanto jornalista. A ousadia paga-se. A abordagem a seguir desenvolvida articula três eixos complementares. Há o domínio do político-social, o papel dos meios de comunicação social e a sua retórica, e as relações de poder. See It Now, o mais célebre programa de Edward R. Murrow, viria também a ser olhado como aquele que mapeou os caminhos do documentário jornalístico de Televisão.


Quando a II Guerra Mundial terminou grandes nomes da rádio norte-americana foram solicitados para ingressar na televisão, o mais poderoso e lucrativo veículo de informação e entretenimento até então conhecido. As principais estações ou eram propriedade ou tinham nascido de empresas de rádio. Por isso, não foi difícil transferir esses profissionais de um medium para o outro. Edward R. Murrow, correspondente da CBS na capital britânica, devido à extraordinária notoriedade que alcançara, fez recair sobre si a maior parte das atenções. Era um excelente jornalista. As reportagens radiofónicas sobre os bombardeamentos de Londres e a Batalha da Inglaterra fizeram dele uma celebridade. O poeta Archibald MacLeish disse ao The New Yorker que Murrow “burned the city of London in our houses and we felt the flames that burned it”. Em This Reporter (1991), um documentário de Susan Steinberg, a sua mulher e alguns colegas recordam que durante os bombardeamentos ele nunca recolhia a um abrigo. Relatava em circunstâncias arriscadas a destruição à sua volta, fosse a partir do topo dos edifícios, fosse a bordo de um bombardeiro da Royal Air Force como aconteceu, no ano de 1943, numa acção de retaliação sobre Berlim.


Murrow tivera lições de dicção e drama. Sabia utilizar a voz como poucos. Charles Kuralt, seu amigo e colaborador, dizia que quando Murrow anunciava no princípio de cada intervenção “This is London” o tempo ficava suspenso. O que se seguia, segundo Kuralt, e pode ser confirmado no documentário de Steinberg, era qualquer coisa como “pintar um quadro com palavras”. Situações descritas com precisão, cada palavra no lugar certo, entonação reveladora do controle do momento.


Em reconhecimento dos serviços prestados, a CBS ofereceu-lhe um lugar na administração. Ocupou o cargo, aparentemente contrariado, durante dois anos. Depois regressou ao jornalismo e foi escolhido para ser o rosto da CBS na televisão com um programa informativo denominado See It Now, uma adaptação do radiofónico Hear it Now, também da sua responsabilidade.


Murrow e o produtor Fred Friendly em Outubro de 1954 Fonte: CBS Photo Archive

See It Now


A primeira emissão de See It Now - anos mais tarde daria origem a 60 Minutes ainda hoje no ar - teve lugar a meio da tarde de 18 de Novembro de 1951, Murrow apresentou-se, bem como aos seus colaboradores – entre eles encontrava-se Fred Friendly, jornalista, produtor e seu braço direito – como sendo uma “velha equipa tentando aprender um novo ramo de actividade ”. Com efeito, quase todos vinham da rádio e estavam a tomar contacto com a televisão. Talvez por isso, o primeiro ano de emissão foi, de certo modo, experimental. Habitualmente, o alinhamento contemplava uma série de estórias, por vezes centradas em figuras públicas, combinando procedimentos do documentário de rádio com técnicas cinematográficas de newsreels. O formato era o de um magazine. Devido à incipiência do desenvolvimento tecnológico, os percalços eram relativamente frequentes. De início, procurou-se evitar a controvérsia, embora o intuito, tal como acontecera com Louis de Rochemont dezassete anos antes ao dar corpo a March of Time, fosse tratar os assuntos em profundidade, marcando uma diferença em relação aos boletins de notícias.


Murrow começou por encarar o medium como um mero veículo de transporte, sem cuidar da sua especificidade. A verdade, porém, é que, pela sua natureza, a televisão operava uma metamorfose. Por via da presença no ecrã, Murrow não só era parte do conteúdo veiculado, mas também fazia crescer à sua volta uma espécie de halo que seria tentador explicar em função do princípio da gestalt de figura/ground. Do mesmo modo, sendo a imagem a preto e branco, de baixa definição, a exigência de participação sensorial para completar a mensagem, da qual McLuhan falaria mais tarde, poderia ser outra hipótese explicativa da aura criada em torno do jornalista. Como diria o comunicólogo canadiano, medium is message. Contudo, aquilo que iria fazer de See It Now um programa incómodo, pouco teria a ver com os seus aforismos. Foram os temas abordados, bem como a rede de relações de índole social, tecnológica e cultural inerente ao período em que a televisão se desenvolveu, que lhe conferiram relevância.


Nos anos 50 a televisão passou a ser o principal meio de entretenimento das famílias americanas Fonte: Vintage Everyday

Na verdade, See It Now foi contemporâneo do período em que a televisão conheceu maior expansão. Em 1947, nos Estados Unidos, apenas um cada 100 lares dispunha de televisão. Em 1955, oitenta por cento tinha, pelo menos, um receptor. Daí resultou uma até então desconhecida capacidade de ressonância e amplificação das mensagens. Por outro lado, a história da televisão americana também está indissociavelmente ligada, do início à fase de consolidação, ao período designado por Década do Medo ou Década do Pesadelo ou, simplesmente, da “caça às bruxas”.


Joseph McCarthy e os media


Esse período vai de 1945 a 1955, mas foi só a 9 de Fevereiro de 1950 que passou a ter um rosto, o do senador republicano Joseph McCarthy. Nesse dia, discursando perante 250 pessoas num jantar promovido pelas mulheres do Partido Republicano da cidade de Wheeling, West Virginia, o até então obscuro político do Wisconsin agitou uma folha de papel, dizendo: “Tenho aqui na minha mão uma lista de 205 nomes de pessoas que são conhecidas pela Secretaria de Estado como sendo membros do Partido Comunista e que, apesar disso, continuam a trabalhar e a influenciar a política do Departamento de Estado”.


Daí a começarem a circular listas negras em todos os sectores da sociedade, incluindo a Casa Branca, foi um pequeno passo. As raízes da orientação persecutória são parcialmente explicadas pela desconfiança dos republicanos em relação a tudo o que, de algum modo, tivesse estado ligado às políticas do New Deal, tendo ganho maior acuidade após a II Guerra Mundial com a progressão do comunismo. Em plena Guerra Fria, a ideia de um País infestado de espiões fizera o seu percurso junto de vastos sectores da sociedade americana, sucedendo-se os episódios reveladores, alguns dos quais trágicos, como o da condenação à morte de Ethel e Julius Rosenberg.


Joseph McCarthy, o senador do Wisconsin cuja paranóia anticomunista o levou a imaginar infiltrados em todos os cantos da América Fonte: People´s World

Os meios de comunicação social mereceram da parte de McCarthy uma atenção especial. Via neles uma correia de transmissão dos comunistas, ponto de vista, aliás, corroborado por um livro de três ex-agentes do FBI denominada Red Channels: The Report of Communist Influence in Radio and Televison, publicado em Junho de 1950, no qual foram denunciados 151 profissionais, na sua maioria dos mais respeitados e com maior notoriedade. Red Channels, amplamente distribuído, não foi apenas uma advertência. Teve consequências na admissão e despedimento de pessoal. Networks como a CBS, onde trabalhava Murrow, mostraram-se particularmente zelosas chegando, primeiro, a institucionalizar uma espécie de juramento anticomunista e, depois, contratando serviços especializados de segurança. Concomitantemente, McCarthy conseguia ampla cobertura. No auge das suas inquirições aparecia diariamente nas primeiras páginas dos jornais. Em 1954, alguns deles chegaram a dar quinze a vinte notícias na mesma edição tendo o senador como protagonista principal .


Na ofensiva pelo controle da televisão, McCarthy legislou no sentido de proibir a exibição de filmes de autores suspeitos de simpatias pelo comunismo e levou o presidente Eisenhower a colocar gente da sua confiança na FCC, a entidade à qual cabia, como ainda hoje cabe, entre outras competências, atribuir, recusar ou retirar as licenças de emissão. Este clima de medo e suspeição levou ao recuo na abordagem de matérias controversas porque, nos termos do regime de patrocínio de programas, tanto o operador quanto o patrocinador eram responsáveis pelos conteúdos veiculados. Mesmo assim, apesar dos constrangimentos, algumas vozes não hesitavam em fazer uso do direito constitucional de liberdade de expressão. Por exemplo, o presidente Harry Truman, atacado por McCarthy por supostamente permitir a infiltração de comunistas no aparelho de estado, acusou publicamente o senador de corrupção da verdade e de falsificação da justiça. As suas palavras ficaram nos anais da política americana:


“É o uso da Grande Mentira e da acusação sem fundamento contra qualquer cidadão em nome dos valores americanos e da segurança. É o abuso de poder de um demagogo que vive na inverdade. É o alastrar do medo e da destruição da confiança em todos os níveis da nossa sociedade”.



Truman, por sinal, foi o responsável pela primeira legislação restritiva sobre segurança nacional nos Estados Unidos durante a Guerra Fria e o seu nome é sempre recordado por ter autorizado o uso da bomba atómica em Hiroshima e Nagasaki.


Christmas in Korea e o documentário jornalístico


See It Now, portanto, foi fazendo o seu percurso num contexto conturbado. No já mencionado documentário This Reporter, Mini Lerner Bonsignori, a montadora dos filmes de Murrow, recorda como as pessoas viviam no terror de perder o emprego. Segundo ela, para tanto bastava uma simples denúncia anónima. Certamente não indiferente aos sinais do tempo, Murrow disse logo na primeira emissão, a 18 de Novembro de 1951, que o programa obedecia a princípios de “serviço público” e que a televisão era “um medium para usar e não para abusar”. Talvez por isso e, certamente, também, devido à crítica da época se mostrar impiedosa com a generalidade da programação televisiva, considerada de uma vacuidade a toda a prova, See it Now, distinguindo-se pelo modo como abordava os assuntos, ganhou prestígio crescente.


Na série de 1952-1953 mudou de formato, passou a tratar apenas um ou dois temas num espaço de 30 minutos. Deixou o horário da tarde para se fixar às dez e meia da noite. A ideia do documentário jornalístico, que viria a atingir o pináculo com Harvest of Shame, da autoria do próprio Murrow, em 1960, começara a ganhar forma. O confronto entre o jornalista e o senador do Wisconsin, também. Na emissão de 23 de Novembro de 1952, ao denunciar a recusa de uma escola secundária de Harrison, Nova Iorque, em ceder o seu auditório para um debate público a pretexto da falta de uma declaração de lealdade patriótica, Murrow sugeriu a possibilidade do sucedido ter uma leitura mais ampla, mas evitou afrontar directamente McCarthy. Por sua vez, modelo que viria a ser apontado como exemplo pioneiro do documentário jornalístico surgiu na série seguinte com Christmas in Korea, exibido em Dezembro de 1953. A partir de então, segundo William Bluem em Documentary in American Television (!965), o número das baixas da guerra, o registo dos avanços e recuos das tropas e as declarações oficiais ficavam para as notícias do dia a dia (hard news). Os aspectos humanos, a análise da situação e a interpretação dos factos seriam da responsabilidade de See It Now.


Murrow a bordo de um avião militar durante a guerra que opôs as duas Coreias, a do Norte e a do Sul, entre 1950 e 1953, causando mais de dois milhões meio de mortos. Os Estados apoiaram o Sul, a União Soviética, o Norte. Fonte: Edward R. Murrow papers

Nessa altura, Murrow já se tinha apercebido da eficácia da presença de gente comum no ecrã. Os seus colaboradores costumavam dizer que o casting de See It Now era feito no terreno. Ao contrário de March of Time (ver neste blogue: Newsreels, Documentário e Buster Keaton: os anos de outro das actualidades cinematográficas), não havia recurso a reconstituições, sendo interdito o uso de actores. Como dizia Fred Friendly “os actores são o povo americano”. Na Coreia, Murrow falou com homens nos seus postos de vigília, perguntou-lhes como se sentiam por passar o Natal fora de casa, que medos os assaltavam, filmou momentos de música e lazer com três militares interpretando Rotation Blues, ouviu as enfermeiras de hospitais de campanha sobre combates que estariam a ser travados, fixou-se nas expressões dos rostos, captou pequenos sinais, mas só por uma vez interrogou um grupo de soldados sobre a guerra tendo obtido respostas evasivas e, por isso mesmo, reveladoras. Havia ainda vistas aéreas do território coreano, pilotos concentrados no painel de instrumentos dos seus aviões, pára-quedistas preparados para saltar, centenas de pára-quedas abertos no espaço descendo para as linhas da frente. Numa escola aldeã, crianças coreanas cantavam uma canção de Natal para os militares americanos.


Christmas in Korea pouco ou nada tem de controverso. Visto hoje tem interesse meramente histórico. Ao tempo, porém, foi inovador. No plano da mensagem, não caindo em excessos de retórica, o filme adopta um ponto de vista em relação ao qual o qualificativo de patriótico não parece excessivo. Algumas sequências do dia a dia dos soldados fazem lembrar os bombeiros de Fires Were Started (1943) de Humphrey Jennings, mas a narrativa está nos antípodas do filme britânico. Neste há uma lógica das imagens e uma suspensão da acção onde o subentendido é mais esclarecedor do que o denotado, ao passo que no documentário de Murrow se verifica a sua intervenção sistemática colocando o primado do enunciado na palavra. Bluem fala mesmo numa lógica da palavra.


Sendo o seu livro Documentary in American Television posterior à publicação de A Galáxia de Gutenberg e Understanding Media, não é improvável algumas das ideias de McLuhan aí terem encontrado eco, mas não no mesmo sentido expresso pelo canadiano. Para Bluem o meio não é a mensagem, e a mensagem obedece a critérios de codificação subjacentes aos meios quentes, como a imprensa. As suas considerações a propósito do documentário jornalístico de televisão levam-no inclusivamente a concluir que este respeita os padrões de raciocínio e de associação de ideias da ordem sequencial característica do jornalismo impresso. Essa ordem inerente, ao pensamento linear, confere um papel de autoridade ao jornalista/ narrador, assim se explicando a necessidade da sua presença recorrente no ecrã como parte constitutiva da mensagem.


Fonte: TimeGhost

A partir de Christmas in Korea a entrevista passou a ser utilizada de forma original e sistemática. Murrow e Friendly viam nela não tanto uma forma de transmitir informação, mas uma possibilidade dramática da revelação da personalidade, dúvidas e conflitos interiores dos entrevistados. Por exemplo, num programa posterior dedicado ao escritor Carl Sandburg pouco mais se vê do que um homem de idade avançada numa cadeira de balanço, como se estivesse a reflectir em voz alta. Para Bluem, a relevância da palavras associada à imagem de um homem a discorrer sobre o mundo acrescentava valor jornalístico à peça. Daí a ausência de artifícios como efeitos, música de fundo e cortes dramáticos. Procedimentos semelhantes foram adoptados em entrevistas de Murrow com, por exemplo, Ghandi, Nehru e Churchill, cuja mera presença no ecrã dava ao público a sensação de se encontrar face a face com a História.


Prólogo de um confronto


Consolidada a reputação See It Now voltou-se para o senador McCarthy. Este estivera no programa logo no primeiro mês de emissões através de uma curta peça de quatro minutos, uma montagem de afirmações contraditórias do senador que passou praticamente despercebida. Alguns meses mais tarde, Murrow entrevistou McCarthy em directo. O senador simplesmente ignorou as perguntas, aproveitando o tempo de antena para levantar suspeitas sobre membros do Congresso e atacar adversários políticos. Também neste caso não houve reacções significativas nem da parte da imprensa nem do público. Só mais tarde, poucos dias antes da emissão de 8 de Março de 1953, inteiramente dedicada ao interrogatório de Reed Harris, director da Voz da América, as águas começaram a agitar-se. Chegaram à CBS os primeiros sinais de desagrado de McCarthy. Harris aparecera na lista negra acusado de actividades vagamente esquerdistas por algo ocorrido há 21 anos. Nesse dia 8 de Março, Murrow fez no final fez um curto e seco comentário sobre aquilo que acabara de ser visto: “um exemplo de técnica de investigação”.


Em Good Night and Good Luck (2006) George Clooney deixa um alerta para o colapso da objectividade jornalística da televisão na era de George W. Bush, antes e após a invasão do Iraque. Clooney não visa directamente nem a Administração nem os media americanos. Utiliza o célebre confronto de Murrow com McCarthy em See It Now como alegoria. Recuperar episódios exemplares do passado para elucidar acontecimentos do presente é recorrente no cinema americano

Em This Reporter Fred Friendly diz que na CBS todos sabiam ser inevitável o confronto com McCarthy. Era uma questão de tempo. Em Outubro de 1953 as inquirições atingiram o paroxismo. Faziam-se ouvir vozes indignadas. Na imprensa próxima dos democratas os comentadores e editorialistas começavam a questionar abertamente os métodos do senador. Por sua vez, See It Now alcançara um estatuto de credibilidade sem paralelo na televisão americana, tendo conquistado uma audiência correspondente a esse estatuto. Estavam, portanto, criadas as condições para um dos episódios mais célebres do jornalismo de televisão nos Estados Unidos.


Interlúdio, flash forward


A memória de Edward R. Murrow, por vezes, parece reverter para o domínio da hagiografia. Ficou dele a imagem do jornalista fiel aos princípios da ética profissional, defensor dos valores democráticos, uma espécie de paladino do bem contra o mal. Esse mal, porém, não era apenas o poderoso adversário político que ajudara a derrotar e que, de algum modo, o arrastaria na queda por razões adiante explicitadas. Era, também, a televisão comercial sujeita à tirania do entretenimento e à dependência dos anunciantes, implacável na punição dos refractários.


Murrow não era nenhum santo. Quando teve de ser pragmático no exercício das suas funções não deixou de o ser. Mas, ao lançar a controvérsia jornalística como elemento de elucidação do debate público sobre questões relevantes apontou um caminho cujo preço os operadores de televisão não estavam dispostos a pagar. O início de Good Night and Good Luck (2006) de George Clooney é justamente a intervenção de Murrow perante a assembleia da Radio-Television News Directors Association (RTNDA), em Chicago, a 15 de Outubro de 1958. Ele começa por advertir os colegas de que poderiam não gostar de ouvir o que tinha para lhes dizer, que poderiam até vir a ser acusados de ter dado acolhimento a um herético, um crítico do estado da televisão comercial e da sua lógica de evasão.


Murrow com Marylin Monroe, uma das numerosas celebridades que entrevistou em Person to Person, por vezes identificado como jornalismo light. A consigna de William Paley, o patrão da CBS, era: Television is business. Fonte: New York Daily News

Na altura, a sua estrela começara a empalidecer. O discurso - o famoso discurso “Wires and lights in a box” que ficaria para a posteridade - soava a uma derradeira tentativa de alertar as consciências:


“Para aqueles que dizem que as pessoas não reparam; que não estão interessadas; que são demasiado complacentes, indiferentes e isoladas, limito-me a responder: há, pelo menos na opinião deste repórter, considerável evidência em contrário. Mas mesmo que estejam certos, que teriam a perder? Porque se estiverem certos e este instrumento servir apenas o entretenimento, a diversão e a evasão, então saberemos que esta lâmpada apenas emite uma luz vacilante e em breve teremos ocasião de constatar que nada valeu a pena”.


Na parte final, um apelo:


“Este instrumento pode ensinar, pode iluminar, pode mesmo inspirar. Mas só pode fazê-lo na medida em que os homens estejam decididos a utilizá-lo para esses fins. De outro modo, não será mais do que cabos e luzes dentro de uma caixa. Há uma grande e porventura decisiva batalha a travar contra a ignorância, a intolerância e a indiferença. A arma da televisão pode ser muito útil”.


Estas palavras foram proferidas quatro anos e alguns meses após a última das quatro emissões de See It Now reportando ao senador McCarthy que foi para o ar em 16 de Março de 1954. A administração da CBS recebeu pressões de vária ordem tendo adoptado uma posição de ambiguidade como o filme de Clooney habilmente ilustra. Se a Murrow sugeriu estar a ir longe de mais, face à pressão dos anunciantes invocou junto do poder institucional os princípios da liberdade de expressão impeditivos de actos de censura.


Em 1955, a ALCOA (Aluminum Company of America) retirou o patrocínio a See It Now, cujo tempo de emissão aumentou para uma hora, mas sem horário regular. Quem conhece o meio sabe ser esta esta uma forma expedita de acabar com algo incómodo. O programa passou a ser anunciado como um “especial de informação”. Gilbert Seldes, crítico cultural, autor do influente livro The Seven Lively Arts (1924) e, posteriormente, director de CBS News sugeriu ironicamente aos executivos da companhia que o programa mudasse de nome para See It Now and Then. Extinto em 1958, o que poderá explicar parcialmente o discurso de Murrow na RTNDA, deu lugar ao CBS Reports, depois 60 Minutes.


Cena de Good Night an Good Luck de George Clooney. Murrow ( David Strathairn) fala aos pares da RTNDA. Citação a propósito do McCarthyism: “We must not confuse dissent with disloyalty. We must remember always that accusation is not proof and that conviction depends upon evidence and due process of law. We will not walk in fear, one of another. We will not be driven by fear into an age of unreason, if we dig deep in our history and our doctrine, and remember that we are not descended from fearful men – not from men who feared to write, to speak, to associate, and to defend causes that were, for the moment, unpopular”.

Continua



  • Foto do escritor: Jorge Campos
    Jorge Campos
  • 5 de mai. de 2021
  • 21 min de leitura

Com este texto fica concluída a publicação do meu livro de há 30 anos ao qual chamei A Caixa Negra. Lendo-o hoje parece-me obviamente datado. No entanto, as preocupações nele manifestadas não estão dissipadas. Quando o escrevi prestei uma atenção particular à televisão americana pela simples razão de ter sido o seu modelo a impor-se, sendo copiado à escala global. E isso foi especialmente relevante no campo da informação. Mas, já nessa altura, se verificava um fenómeno que, mais tarde, viria a generalizar-se, ou seja, o resvalar do jornalismo para o campo do entretenimento, de modo a garantir não só audiências, mas também a satisfação dos patrocinadores. Já nem falo da guerra legitimada pela mentira como sucederia na Guerra do Golfo com o famigerado caso das armas de destruição maciça. Gostaria de acrescentar o seguinte. A televisão tanto pode ser um mundo fascinante quanto um lamentável contentor de lixo, no qual pululam celebridades sem espessura e especialistas na conversa da treta. Mas, sempre que foi estimulante deu corpo a ícones cuja memória perdura apesar da conspiração contra a memória de que, tantas vezes, ela própria, se faz eco. Fiz questão de evocar aqui alguns desse ícones do jornalismo televisivo americano. Muitas vezes disseram uma coisa e fizeram o seu contrário, é verdade. Houve, no entanto, um denominador comum: todos eles, dando-se conta de um desastre anunciado, fizeram muitas perguntas. E, no fim, disseram o que tinham a dizer.



Fonte: Line-17QQ

UM PRESENTE SEM MEMÓRIA


Ao contrário da notícia tradicional, de ordem histórica, a notícia televisiva envelhece depressa, muitas vezes não deixando rasto. Existe no instante. O homem, neste mundo das imagens, é envolvido por um turbilhão de informações, cuja velocidade de circulação impossibilita o conhecimento mais pormenorizado sobre acontecimentos já de si, tantas vezes, apresentados fora do contexto histórico. O presente como que se esgota em si mesmo, prisioneiro da repetição mecânica de estereótipos de realidades complexas. E quem conhece os meandros do campo informativo é obrigado a reconhecer a precariedade cultural de muitos dos seus agentes, dado o modo como confundem o impacto efémero da espectacularidade induzida com a outra dimensão do jornalismo, mais analítica e, por isso mesmo, estimuladora da cidadania.


Faz-se, muitas vezes, uma informação do simulacro sustentada, aliás, pelo argumento segundo o qual informar se resume a transmitir factos, como se essa transmissão não obedecesse, necessariamente, a uma retórica. A perspectiva da informação dos factos sem memória leva até a sugerir, embora poucos tenham a franqueza de o afirmar, a substituição do conceito de jornalista pelo conceito de comunicador, Como diz Alain Woodrow:


"A ideia da comunicação pura, sem intermediário, sem comentários escusados, que encontra a sua expressão ideal em imagens sem palavras, denuncia um objectivo inconfessado. Por detrás da filosofia da informação exclusivamente factual, lisa, sem qualquer espécie de 'parasita' (o jornalista, entenda-se), esconde-se uma vontade conservadora de não incomodar o status quo. Perante um jornalismo 'activo' que procura situar o acontecimento, revelar o seu significado através de um comentário, propaga-se agora um jornalismo 'passivo', asséptico, composto de factos brutos, oferecidos sem hierarquia nem código."(1)


Richard Salant

Esta informação de encher o olho é especialmente propícia à evasão. Permite ao espectador "sonhar" perante factos dramáticos devidamente embrulhados, empacotados e dados a conhecer por um apresentador-vedeta em torno do qual se organiza o espectáculo informativo. Por vezes, o jornal televisivo mais parece uma tétrico-novela com as suas imagens dos crimes, violências e mistérios alheios, aos quais servem de contraponto as boas causas e as sacrossantas virtudes domésticas. Sensorial e impositiva, a notícia resolve-se num produto cujo consumo regular dispensa a interrogação construindo um quotidiano desprovido da espessura da memória, sem a qual não é possível reconhecer no passado os traços de uma identidade cultural integradora de qualquer projecto ou de qualquer futuro. (Nota do autor 2021: este texto foi escrito no rescaldo do cavaquismo, numa altura em que ainda não havia televisão segmentada em Portugal com o seu casting de comentadores maioritariamente sistémicos. Agora, os jornais televisivos também já não são bem assim, pese embora a resiliência de alguns procedimentos).


Quererá isto dizer que a Televisão está condenada ao constrangimento tendencialmente totalitário das consciências e que as notícias, fechadas no seu próprio simulacro, se destinarão sempre e unicamente a legitimar os discursos dominantes?


Não, necessariamente. Tomemos o caso das notícias. Saber o que está a acontecer é apesar de tudo,


UMA GARANTIA DE LIBERDADE.


Umberto Eco dá o seguinte exemplo:


"Saber, como o escravo egípcio acabava por vir a saber, mesmo dez anos depois, que uma coisa aconteceu, não me ajuda a modificá-la; saber pelo contrário o que está acontecer faz-me sentir co-responsável do acontecimento. Um servo da gleba medieval não podia fazer nada para aprovar ou desaprovar a primeira cruzada, da qual vinha a ter conhecimento anos depois; o cidadão da metrópole contemporânea, imediatamente em dia sobre a crise cubana, pode tomar partido por um ou por outro e contribuir para determinar o curso dos eventos com a sua manifestação pública, a petição ao jornal e, em certos casos, o voto ou a revolução."(2)


Possivelmente, se fosse hoje, Eco não teria colocado o problema exactamente da mesma maneira, até porque, desde 1964 até agora muita coisa mudou no domínio da comunicação. De qualquer modo, quanto mais não fosse por razões que possibilitem uma intervenção cívica e cultural no sentido de melhorar as relações entre a Televisão e a Democracia e, portanto, melhorar a própria Democracia, seria sempre indispensável procurar entender o fenómeno em toda a sua complexidade, evitando a retórica moralista.


Fonte: Quote Master

Evidentemente, a Televisão é um formidável instrumento de poder. Permite forjar os costumes sociais com uma eficácia e uma rapidez novas na história. Tende a ser a principal matriz dos comportamentos. E a confirmar-se a hipótese de McLuhan, não só veicula como incorpora a mensagem, confundindo-se com ela, ou seja, a estabilização dos valores, costumes e comportamentos sociais faz-se não em função dos conteúdos da mensagem, mas simplesmente pelo facto de eles serem transmitidas pela Televisão. Sendo assim, não parece excessivo afirmar que a educação para a democracia passa necessariamente pelo caminho da Televisão porque ela é "um ponto de intersecção de toda a vida política, económica e social da actualidade" como diz Konder Comparato.(3)


Posto o problema nestes termos, justifica-se uma intervenção institucional reguladora, por exemplo, quanto aos estatutos das televisões públicas e às diversas matérias susceptíveis de integrar a disciplina do Direito da Comunicação. No nosso caso, se importa sublinhar a importância dos jornalistas acompanharem e participarem nesses processos, interessa-nos sobretudo avançar noutras direcções, porventura menos conhecidas, mas igualmente determinantes na equação do binómio melhor Televisão — melhor Democracia. Genericamente, chamar-se-ia a essa área de prospecção a área do saber fazer. Lá iremos.




UMA HISTÓRIA EXEMPLAR


Uma história exemplar sobre o mundo das notícias na Televisão é relatada no livro de Peter J. Boyer intitulado Quem matou a CBS?, sub-titulado A derrocada da maior rede de Televisão americana.(4) Ao longo de mais de quatrocentas páginas, Boyer faz a descrição pormenorizada sobre a evolução do Departamento de Informação (CBS News) da mais poderosa network dos Estados Unidos, demonstrando como até que ponto a guerra das audiências acabou por banalizar um sector construído pedra a pedra por um notável grupo de jornalistas, no qual se destacaram figuras como Edward R. Murrow e Walter Cronkite.


Fonte: John P. Walsh

See it now, de Murrow, foi um dos informativos de maior impacto de todos os tempos. À volta do jornalista constituiu-se uma equipa — os garotos de Murrow, como eram conhecidos — quase todos com graduação académica universitária e larga tarimba como repórteres, posteriormente figuras públicas respeitadas pela sua competência e seriedade profissionais. Cronkite foi dos que mais se destacou. O seu jornal CBS Evening News era a pérola da estação, permanecendo por mais de uma década no primeiro lugar das tabelas de audiência telejornais. Era um jornalismo feito de rigor, sempre na linha da frente, recorrendo aos repórteres mais experientes, alguns deles singularmente capazes de aprofundarem as questões no escasso tempo de que dispunham.


Quando Cronkite se retirou em 1980 e foi substituído por Dan Rather as coisas começam a dar para o torto. Rather era um excelente jornalista, mas teria sempre de se sujeitar a ser comparado com o seu antecessor. Houve uma quebra da audiência e a CBS foi mesmo ultrapassada pelas rivais ABC e NBC.


Apareceu, então, Van Gordon Sauter , um jornalista com experiência na imprensa e na rádio. À frente da CBS News, Sauter tratou de arranjar nova fórmula para as notícias. E não se saiu mal, pois, ao cabo de dois anos de angústia, Rather pôde readquirir a confiança e o jornal televisivo voltou a saltar para o primeiro lugar, ultrapassando a concorrência. Em que consistiu a fórmula de Sauter? Fez aquilo que ficou conhecido como uma informação de momentos, apelando à emotividade do espectador, e reforçou a componente do grafismo electrónico e dos efeitos especiais, conferindo, em suma, uma maior espectacularidade às notícias.


Van Gordon Sauter. Fonte: The Daily Wire

Segundo os profissionais mais antigos, aliás, gradualmente afastados e sucessivamente substituídos por "caçadores de momentos", o CBS Evening News resvalou para terrenos de crescente ambiguidade. O mesmo aconteceu noutros informativos, designadamente o matinal. Neste espaço, a velha guarda perdeu definitivamente a esperança de salvaguardar a imagem de marca da estação quando, em 1984, Sauter tirou outro coelho da cartola. Pela primeira vez na história da CBS, colocou uma pessoa sem habilitação nem preparação a apresentar o Morning News: Phyllis George, ex-miss América.


Miss George aguentou o posto oito meses, tempo suficiente para se fazer notar muito mais pelas gafes do que pela sua estupenda imagem. A contundência da crítica obrigou a CBS a encontrar uma saída diplomática. Phyllis George, alegando motivos da vida pessoal e sentimental, disse adeus à estação. A estação, evidentemente, viu-a partir com pena. Mas o mal estava feito e o descrédito acumulado ao longo dos últimos anos seria amargamente comentado por Walter Cronkite, por altura do funeral de Charles Collinwood, um dos ícones da CBS News, ao afirmar que o continuum do grande Murrow "chegara de facto ao ponto terminal". (Nota do Autor: Phyllis George viria a adquirir notoriedade na cobertura de eventos desportivos. Também teve sucesso com a empresa “Chicken by George” e, mais tarde, com o negócio de cosméticos e produtos de beleza. Em 1991 chegou a ser considerada empresária do ano).


Phyllis George enquanto Miss America. Fonte: Canoe.com

Tratando-se de um gigante da comunicação com um passado invejável no campo informativo, a degradação das notícias no sentido da superficialidade foi especialmente significativa. Obrigada a fazer face à concorrência, a CBS baixou o nível. E os anos 90 chegaram carregados de ameaças, não apenas para ela própria, mas para a Televisão no seu conjunto. Se algumas empresas lucraram, outras sobreviveram com dificuldade, outras ainda entraram em colapso. Tudo isso faz parte do jogo do mercado. Mas, seja nos Estados Unidos, seja na Europa, onde continuam a mercar presença as televisões públicas, a perda de credibilidade da informação contribui para o adensar das nuvens negras. Os estudos de opinião dão conta disso.(5)


A CAIXA DE PANDORA


É cada vez maior o número de jornalistas e cidadãos, sobretudo após o sobressalto das consciências provocado pela guerra do Golfo, a veicularem essa ideia. Em França, por exemplo, uma sondagem efectuada junto de jornalistas concluiu que 75% pensavam que a cobertura da guerra fora mero jornalismo-espectáculo, enquanto 53% se manifestaram convencidos da perda de credibilidade dos media face à cobertura dos acontecimentos. Aliás, 83% dos inquiridos reconheceram terem sido manipulados por diversas instâncias. E se os jornalistas foram manipulados o que não terá acontecido com o público?


Redactor da secção de Rádio-Televisão do Le Monde, Alain Woodrow insurge-se, por outro lado, contra a diluição das fronteiras entre o jornalista e o locutor em "emissões bastardas onde o divertimento se sobrepõe à informação e o espectáculo ao debate de ideias."(6) Diz ele:


"Em nome do marketing, a linguagem precisa, especializada, da informação cede o lugar ao algaraviado da 'comunicação', conceito próprio do saque medieval, mas agora dominado pela publicidade. O resultado é uma amálgama entre a informação e o entretenimento proporcionado por um jornalista-animador."(7)


Woodrow compara a Televisão à caixa de Pandora:


"Caixa de malícias e de manipulações, lupa que deforma à custa das suas lentes de aumento e bola de cristal hipnótica capaz, quando colocada nas mãos de charlatães, de adormecer a Opinião Pública e de anestesiar as suas reacções morais."(8)


Do outro lado do Atlântico a crítica não é menos feroz. Richard Hardwood, editorialista do Washington Post, não poupou algumas das vedetas destacadas para o Golfo, entre as quais Dan Rather, Tom Brokaw e Sam Donaldson. Os conhecimentos jornalísticos e académicos destas pessoas sobre o Médio Oriente, disse Hardwood, são modestos ou nulos,


"mas trata-se de stars, de clowns à volta dos quais as networks montam as operações especiais que atraem um público numeroso e, por conseguinte, a publicidade e as suas receitas. Em vez de investir no acompanhamento da evolução de uma região, as televisões nunca falam da maioria dos países estrangeiros antes de estalar uma crise. Nessa alturas, lançam as suas vedetas de pára-quedas. Ora acontece que, em termos de guerra, o telespectador não tem vontade de ver anchormen no ecrã, mas sim reportagens feitas por repórteres competentes." (9)


Fonte: Flirck

NEGATIVE SPOTS


Quando Jean Cazeneuve (10) identificou um novo homem político a partir do início da década de 60, na sequência da campanha eleitoral de John F. Kennedy orientada para a Televisão, dificilmente se acreditaria que a política e os políticos chegariam onde chegaram. Um exemplo que fez história foi a campanha presidencial que opôs George Bush a Michael Dukakis, em 1988, marcada pela saturação dos chamados negative spots, ou seja, peças publicitárias destinadas a desacreditar o adversário.


O episódio de Willie Horton foi edificante. À semelhança de outros também o estado de Dukakis, Massachussets, permite a saída das penitenciárias de condenados a penas de prisão em determinados períodos. Um assassino negro de nome Willie Horton beneficiou de uma dessas autorizações e violou uma mulher branca do estado de Maryland. O staff de Bush apressou-se a utilizar o facto a seu favor inundando a televisão com todo tipo de acusações. No Illinois, por exemplo, o Partido Republicano difundiu a seguinte mensagem: "Todos os assassinos, violadores e traficantes de droga votam em Dukakis. No Illinois, podemos votar contra ele."(11)


O caso Willie Hortn. Fonte: History.com

Os limites do odioso foram de novo ultrapassados quando, num spot de trinta segundos, o marido da mulher violada por Willie Horton veio dizer: "Durante doze horas fui espancado, ferido e aterrorizado. A minha mulher foi brutalmente violada. Tememos que as pessoas não saibam verdadeiramente quem é Michael Dukakis."(12) Dukakis levou tempo a reagir mas quando o fez foi para divulgar a fotografia de uma "mãe grávida" assassinada por um violador hispânico "libertado por Bush".


Os principais jornais americanos criticaram duramente a campanha televisiva. O correspondente do Los Angeles Times, John Balzar, interrogava-se: debate de ideias, democracia? E respondia: "Os consultores de imagem dos políticos não fazem o seu trabalho porque pensam que têm alguma responsabilidade de educar o público. Eles são pagos para ganhar e é somente nisso que estão empenhados."(13)


A corrida às frases-chave (sound-bite) transformou-se em algo alucinante. Há dez anos uma dessas frases tinha, em média, 45 segundos; em 1984, 10 segundos; e em 1988, oito segundos. Exemplos ?


Bush: "Leiam nos meus lábios: não haverá novos impostos."


Dukakis: "A melhor das Américas não está no que ficou para trás; a melhor das Américas está ainda para chegar."


E estava tudo dito.


A situação seria lapidarmente resumida no CBS Evening News de Dan Rather de 24 de Outubro de 1988. Rather fez a seguinte pergunta ao candidato Dukakis:


"Se lhe foi necessário tanto tempo para responder à publicidade de George Bush, se teve tanta dificuldade em reunir uma boa equipa de marketing, porque haveríamos nós de lhe dar o crédito da nossa confiança para organizar o governo e dirigir o País ?"(14)


No dia das eleições apenas votou metade do eleitorado. De entre os votantes só 35% se manifestaram satisfeitos com as possibilidades de escolha. E James Baker, director da campanha de Bush, foi nomeado secretário de estado.


TELEPRESENÇA


A Televisão produziu uma mutação no relacionamento das pessoas com o tempo. Antes, como se disse, havia o passado, o presente e o futuro. Agora há a telepresença do mundo. A comunicação electrónica aboliu a distância. Todavia, só a distância entre o acontecimento e o acto de informar permite trabalhar a informação. Que importa o rigor quando se tem na mão o instante do espectáculo ? Dir-se-á: é preciso reagir no momento e não há tempo para reflectir. Mas, a ser assim, e se aquilo que se viu já passou, haverá tempo para a democracia no tempo real?


Fonte: Anonymous Art of Revolution

São questões pertinentes. Afinal, se não é legítimo condicionar a liberdade dos media nem por isso deixa de ser razoável que os cidadãos se interroguem sobre eles, adoptando uma atitude vigilante. Alguém duvida que a televisão há--de marcar indelevelmente os tempos vindouros ?


Um autor francês, Jacques Thibau (15), diplomata de carreira e, na segunda metade da década de 60, promotor de um novo tipo de informação na então O.R.T.F., dizia só haver um critério para ajuizar da Televisão: ou é boa ou má. Boa, se feita de uma forma honesta, criativa e competente. Má, se subordinada a intuitos de manipulação. Jacques Thibau foi rapidamente afastado, em Janeiro de 1968, porque a sua política informativa inquietava o poder gaullista. Mas não foi possível afastar a sua ideia sobre a boa e a má Televisão. Independentemente da invasão do lixo, inevitável devido à segmentação do mercado e às diversas modalidades de transmissão possibilitada pelas novas tecnologias, e até por isso mesmo, continua de pé o objectivo de fazer boa Televisão.


Se até agora tem sido feito referência a preocupações que estão na primeira linha da actualidade, é bom não esquecer as espantosas possibilidades abertas pela Televisão no domínio da divulgação dos conhecimentos e do despertar das consciências, como, sumariamente, se verá adiante. Entretanto, é útil esclarecer um ponto sobre o qual os juízos são especialmente severos, sobretudo por parte de quem se dedica à escrita, designadamente na imprensa. Diz respeito à imagem, encarada, como portadora de todos os males. A suspeição em relação ao mundo das imagens não é nova. Já Pascal chamava à imagem


"A LOUCA DA RAZÃO",


de modo a sublinhar o seu lado emocional. Segundo Eco,


"a linguagem da imagem foi sempre o instrumento de sociedades paternalistas que subtraíam aos seus próprios dirigidos o privilégio de um corpo a corpo brilhante com o significado que fora comunicado, livre da presença sugestiva de um 'ícone' concreto, cómodo e persuasivo”. (16)


É verdade. Simplesmente o problema já não se coloca assim e muito menos como pretendem aqueles que sustentam que a imagem electrónica é em si mesma redutora, simplista e falsificadora. Se encarado nessa perspectiva o problema simplesmente não teria solução. Mais, as coisas só poderiam encaminhar-se para uma espécie de atrofiamento da inteligência, situação que, até agora, a História não confirmou. Por isso, a questão não reside tanto numa suposta irredutibilidade conceptual da imagem mas, sobretudo, na disponibilidade para aprender a lidar com ela.


Um dia, entrevistado para a série de programas televisivos "A Caixa que mudou o mundo", Dick Salant, uma das figuras carismáticas da CBS, disse a propósito das "piruetas" dos candidatos em campanha eleitoral:


"Lá virá um dia em que os repórteres do telejornal hão-de dizer simplesmente qualquer coisa como 'o candidato hoje esteve em seis lugares diferentes e não disse nada'. Porque é isso o que efectivamente se passa. Mas a Televisão ainda não chegou a esse ponto." (17)


Na verdade, de certa maneira, as coisas até pioraram substancialmente nos últimos anos. Os talk-shows de Geraldo Riviera, na CBS, proporcionaram espectáculos arrepiantes com temas como o satanismo, orgias sangrentas e violações rituais de crianças. Recentemente, Dick Salant, durante muito tempo ligado às notícias e, mais tarde, presidente da estação, comentou: "A merda dá dinheiro". E sobre a Informação: "Hoje pratica-se o jornalismo fast-food. Já nada do que se passa no pequeno ecrã me surpreende. No meu tempo, tínhamos um código, uma deontologia: agora sacrifica-se tudo no altar das audiências."(18)




Dito isto, se a vigilância crítica não deve ser complacente, nem por isso se deve ignorar a outra face da moeda. Apesar de todos os constrangimentos, não é verdade, por exemplo, que as forças anti-apartheid fizeram questão em tornar público um agradecimento à CNN por ter dado a conhecer ao mundo o verdadeiro rosto de um regime estruturado em função da cor da pele das pessoas? E que dizer da divulgação, através de séries documentais, da vida dos povos da terra ou de obras tradicionalmente reservadas às elites culturais?


CONSIDERAÇÕES FINAIS


A Televisão é, pois, um universo contraditório. Tem enormes possibilidades como meio de comunicação e instrumento de progresso da humanidade, mas revela-se francamente insatisfatória em diversos domínios. O apontar dos erros, ou o sentido de erro de que falei nas linhas introdutórias do texto, se não faz o juízo universal permite, ao menos, a par do sentido de ética, indagar sobre os caminhos a percorrer na convicção de que a democracia é uma aspiração da generalidade dos povos do planeta, cuja principal virtualidade consiste em auto-aperfeiçoar-se, assim os homens o queiram. É certamente difícil gerar consensos em matéria no seio da qual se confrontam estratégias de poder efectivamente conflituantes, à mistura com um pragmatismo que tudo tende a justificar em nome de males menores. Mas para o jornalista há algo de incontornável que é o investimento no saber fazer.


O saber fazer é intrinsecamente democrático, pois permite fazer boa Televisão e boa Informação, transformando o jornalismo num acto de intervenção eminentemente cultural. A linguagem da Televisão herdou elementos de outras formas de expressão, como o cinema e o teatro, e foi ganhando progressiva autonomia gramatical. Esse percurso, a par das possibilidades introduzidas pelas novas tecnologias da comunicação, permite desde já introduzir um novo elemento do discurso informativo que é a dimensão estética. Trata-se, a meu ver, de uma ideia sobre a qual vale a pena reflectir.


Em primeiro lugar, a comunicação mediática continua a ser assimétrica e essencialmente unidireccional. Só o emissor exerce controle sobre a codificação da mensagem, cabendo ao receptor um papel relativamente passivo, apesar das modalidades, aliás, precárias, de feed-back que pode accionar.


Em segundo lugar, a sensorialidade da Televisão induz um défice participativo face às suas potencialidades caso a mensagem seja mal codificada, acentuando, por isso o risco do efeito de hipnose e a consequente perda de vontade de agir sobre o mundo.


Ora o saber fazer se não evita, pelo menos reduz, os inconvenientes decorrentes da unidirecionalidade do medium, bem como os prejuízos de um envolvimento entorpecente promovido por mensagens codificadas incorrectamente. Porquê? Porque uma qualidade acrescida da competência comunicativa do emissor — o saber fazer — só pode ter como consequência uma qualidade acrescida da competência comunicativa do receptor — o saber reconhecer. Mas a ideia do saber fazer vai mais longe.


Sendo a Televisão um medium de grande plasticidade é um dado adquirido a sua relevância estética, em particular, na reportagem, que vai buscar ao cinema algumas das suas regras. Essa dimensão não se confunde, entretanto, com a espectacularidade gratuita dos efeitos proporcionada pelo instrumental electrónico. Pelo contrário, a estética da mensagem televisiva deve reforçar o conteúdo informativo, respeitando o rigor e a verdade dos factos e proporcionando, desse modo, um valor acrescentado ao acto de descodificação, posto que autoriza o prazer do texto colocando o receptor na situação de ser, também ele um (re)criador. O que é obviamente uma forma avançada de fazer progredir a democracia.


Entendamo-nos, porém, e para terminar. Aparentemente vivemos um mundo de libertação das diferenças. Derrubada a ideia de uma realidade central da história, nem por isso o mundo da comunicação generalizada prescinde de um sentido e de uma memória. O que acontece é que as diversas minorias, sejam elas étnicas, sexuais, religiosas ou de um outro tipo qualquer, estão a tomar a palavra à revelia dos modelos universais centralizadores.


"Este processo de libertação — diz Vattimo — não é necessariamente o abandono de todas as regras, a manifestação informe da demarcação: também os dialectos têm uma gramática e uma sintaxe, mas só quando conquistam dignidade e visibilidade descobrem a sua própria gramática. "(19)


Fica, portanto, em aberto uma hipótese aliciante: hoje, o tecido da democracia é percorrido transversalmente pelas linguagens em gestação das diferenças; paradoxalmente, ao promoverem a "desrealização" da realidade os media criaram uma fantasmagoria a partir da qual, entretanto, estão a emergir múltiplas e novas realidades, as quais ameaçam, minam e gradualmente subvertem o mundo estereotipado e massificado da aldeia global anunciada. Neste contexto, o saber fazer do jornalista é uma mais-valia na leitura do mundo e um valor acrescentado ao aprofundamento da liberdade e da democracia.


EPÍLOGO


Foto: Tina Rataj-Berard

PROMETEU

desobedecendo às ordens de Zeus, deu o segredo do fogo aos homens. Vingativo, por natureza, como todos os deuses feitos à imagem e semelhança do homem, Zeus acorrentou-o a um rochedo nas alturas onde, durante largo tempo, uns trinta mil anos ao que parece, foi visitado diariamente por uma águia voraz. A águia comia-lhe o fígado e o fígado recuperava todos os dias para eternizar o sofrimento de Prometeu.


Zeus, claro, resolveu vingar-se igualmente dos homens que andavam todos contentes com o fogo e, para tal, como não podia deixar de ser, criou a mulher, Pandora, a qual foi dada em casamento a um sujeito um tanto irresponsável de nome Epimeteu, por sinal, irmão de Prometeu. Pandora levou consigo uma caixa de cobre reluzente, oferta do deus dos deuses, com a indicação de não a abrir em circunstância alguma. Evidentemente, um belo dia Pandora abriu mesmo a caixa e em lugar das jóias e riquezas cobiçadas deparou com todos os demónios e todas as desgraças, que logo se espalharam pelo mundo. Zeus estava vingado, mas Pandora foi ainda a tempo de fechar a caixa, nela guardando o que restava, a esperança.


Moral da história: enquanto há vida, há esperança.


Simplesmente, os mitos, às vezes, são mais complicados do que parecem. Na verdade, há em tudo isto um gesto mesquinho, daqueles de que só os deuses são capazes, e dois actos heróicos. O gesto mesquinho é, naturalmente, o exercício de um poder arbitrário e caprichoso como via da manutenção de uma determinada ordem. Os actos heróicos, o ousar transgredir pondo em causa a ordem aparente das coisas.


Se Ulisses nos tivesse deixado as suas memórias, não seria de todo improvável que deixasse transparecer algum tédio a propósito do encontro com Penélope porque aventurosa e bem aventurada fora, afinal, a viagem para Ítaca, o percurso. Pandora, movida pela curiosidade, abriu a caixa de Zeus, pois só assim poderia conhecer o que nela se guardava. Evidentemente correu um risco, tal como Prometeu, mas ambos contribuíram para alargar o conhecimento e a consciência dos homens, porventura de uma forma ambivalente e, até, ambígua.


E o facto é que nada é linear. Jacques Thibau, diplomata de carreira, autor de uma obra citada no último capítulo deste texto, hoje praticamente esquecido, teve um percurso interessante, embora não muito agradável. Entrou para a televisão pública francesa pela mão do poder, entusiasmou-se com o mundo da caixa mágica, quis fazer diferente e melhor e acabou por incorrer no desagrado de Zeus. Isto passou-se entre 1965 e 1968, antes do mês de Maio.


O pior inimigo da boa Televisão — dizia ele — é o conformismo, querendo com isso afirmar não um qualquer apelo à revolta, mas tão somente ser indispensável estimular a imaginação, fazer um jornalismo ousado, rigoroso e criativo.


Talvez seja uma ideia mítica, mas é uma boa ideia.


Fonte: Grace Dow - Medium


FIM


Notas remissivas


1. WOODROW, Alain

Informação, Manipulação, Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1991

2. ECO, Humberto

Apocalípticos e Integrados, Difel, Lisboa (1991)

3. COMPARATO, Konder in Guia Alfabético das Comunicações de Massa, Propaganda, Edições 70, Lisboa, sem data

4. BOYER, Peter J.

Quem matou a CBS ? A derrocada da maior rede de Televisão americana, Editora Bertrand Brasil S.A., Rio de Janeiro, 1991

5. Em Le Monde Diplomatique, maniéres de voir, nº 14, há diversos exemplos neste

domínio.

6. WOODROW, Alain

Informação, Manipulação, Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1991

7. Ibidem

8. Ibidem

9. Ibidem

10. CAZENEUVE, Jean

Les pouvoirs de la Télévision, Éditions Gallimard, Paris, 1970

11. Em Le Monde Diplomatique, maniéres de voir, nº 14, há diversos exemplos

neste domínio.

12. Ibidem

13. Ibidem

14. Ibidem

15. THIBAU, Jacques

Une Télévision pour tous les Fraçais, Éditions du Seuil, Paris, 1970

16. ECO, Humberto

Apocalípticos e Integrados, Difel, Lisboa (1991)

17. A citação de Dick Salant é tirado do 12º episódio de "A Caixa que mudou o Mundo".

18. WOODROW, Alain

Informação, Manipulação, Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1991

19. VATTIMO, Gianni

A Sociedade Transparente, Relógio D'Água, Lisboa, 1992


BIBLIOGRAFIA de A CAIXA NEGRA

ALBERT, P. e TUDESQ, A.J.

História da Rádio e Televisão, Editorial Notícias, Lisboa, sem data

AOR DA CUNHA, Albertino

Tele-Jornalismo, Editora Atlas S.A., São Paulo, 1990

BAGGALEY, Jon P. e DUCK, Steve W.

Análisis del mensage televisivo, Editorial Gustavo Gili, S.A., Barcelona, 1979

BAPTISTA, J. e VALDEMAR, A.

Repórteres e Reportagens de Primeira Página, Conselho de Imprensa, Lisboa, 1990.

BARSALOU, Joseph

Questions au journalisme, Éditions Stock, Paris, 1973

BARTHES, Roland

Mitologias, Edições 70, Lisboa, 1984

BAUDRILLARD, Jean

A Sociedade de Consumo, Edições 70, Lisboa, 1981

BESSY, Maurice

Orson Welles, Editorial Presença, Lisboa, 1965

BIRDWHISTELL, Ray L.

Kinesics and Context, University of Pennsylvania Press, Philadelphia, 1970

BIRIUKOV, N. S.

A Televisão no Ocidente e as suas Doutrinas, edições Avante!, Lisboa, 1987

BORETSKY, R. A. e YOUROVSKY, A.

Television Journalism, International Organization of Journalists, Prague, 1970

BORETSKY, R. e KUZNETSOV, G.

O Trabalho de Jornalista e a Televisão, Organização Internacional de Jornalistas, Praga, 1983

BOYER, Peter J.

Quem matou a CBS ? A derrocada da maior rede de televisão Americana, Editora Bertrand Brasil S.A., Rio de Janeiro, 1991

CARLOS MUÑOZ C.

Television, Violencia e Agresion, Universidad Central de Venezuela, Caracas, 1981

CAZENEUVE, Jean

Les pouvoirs de la Télévision, Éditions Gallimard, Paris, 1970

El Hombre telespectador (Homo telespectador), Editorial Gustavo Gili, S.A., Barcelona, 1977

CHEVALIER, J e CHEERBRANT,A.

Dictionnaire des Symboles, Éditions Robert Laffont S.A. et Éditions Jupiter, Paris, 1982

CLOUTIER, Jean

A Era de Emerec ou a Comunicação audio-scripto-visual na Hora dos self--media, Instituto de Tecnologia Educativa, Lisboa, 1975

COMPARATO, Konder

in Rede Imaginária, Secretaria Municipal de Cultura, Companhia das Letras, São Paulo, 1991

CORREIA, Tupa Gomes

Opinião pública, Global editora, São Paulo, 1988

COSTA, Pere-Oriol

La crisis de la televisión pública, Ediciones Paidós, Barcelona, 1986

COSTELLA, António

Comunicação - Do Grito ao Satélite, Editora Mantiqueira, São Paulo, 1984

DAVIS, Flora

A Comunicação Não-Verbal, Summus Editorial, São Paulo, 1979

ECO, Humberto

Apocalípticos e Integrados, Difel, Lisboa (1991).

EINSENSTEIN, S. M.

Obras Escolhidas, edições Yusskússtvô, Moscovo, sem data

FERREIRA, Argemiro

in Rede Imaginária, Secretaria Municipal de Cultura, Companhia das Letras, São Paulo, 1991

FISKE, J. e HARTLEY, J.

Reading Television, Methuen & Co. Ltd., London, 1978

GAILLARD, Philippe

O Jornalismo, Publicações Europa-América, Lisboa, 1974

GARCIA, Jaime Barroso

Tratamiento de la Information en Televisión, Instituo Oficial de Radio Y Televisión/Ente Publico RTVE, Madrid, 1987

GIACOMANTONIO, Marcello

Os meios audiovisuais, Edições 70, Lisboa, 1981

GRANJA, Vasco

Dziga Vertov, Livros Horizonte, Lisboa, 1981

HALE, Julian

Radio Power - Propaganda and International Broadcasting, Eleks Books Limited, London, 1975

HERREROS, M. Cébrian

Introducción al Lenguage de la Televisión - Una Perspectiva Semiótica, Ediciones Pirámide, S.A., Madrid, 1978

JEANNE, R. e FORD, C.

História Ilustrada do Cinema, Enciclopédia de Bolso Bertrand, Lisboa, 1977

JOSÉ, C. e ALMEIDA, M. de

Uma nova ordem audiovisual, Summus Editorial, São Paulo, 1988

KATZ, E., LAZARSFELD, P.

Personal Influence: The Part Played by People in the Flow of Mass Communications, Free Press, New York, 1955.

LITTLEJOHN, Stephen W.

Fundamentos teóricos da comunicação humana, Editora Guanabara, Rio de Janeiro, 1988

LIPPMANN, Walter

Public Opinion, MacMillan, New York, 1921

LOTMAN, Yuri

Estética e Semiótica do Cinema, Editorial Estampa, Lisboa, 1978

MASSON, Phillipe

Guia do Vídeo e da Câmara de Vídeo, Publicações Europa-America, Lisboa, 1987

McLUHAN, Marshall

A Galáxia de Gutenberg, Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1977

Os Meios de Comunicação com Extensões do Homem, Cultrix, S. Paulo, 1988

MILLERSON, Gerald

Técnicas da câmara de vídeo, Gradiva-Publicações, Lisboa, 1988

MIRANDA, Orlando

Tio Patinhas e os Mitos da Comunicação, Summus Editorial, São Paulo, 1976

MOLES, Abraham

La Comunication et les Mass Media, Marabout, Paris, 1973

Sociodynamique de la culture, Éditions Mouton, Paris, 1967

MORIN, Edgar

L'Espirit du Temps, Essai sur la culture de masse , Grasset, Paris, 1962

As Estrelas de Cinema, Livros Horizonte, Lisboa, 1980

NAMER, Gérard

in Guia Alfabético das Comunicações de Massa, Propaganda, Edições 70, Lisboa, sem data

NEPOMUCENO, Eric

in Rede Imaginária, Secretaria Municipal de Cultura, Companhia das Letras, São Paulo, 1991

PAILLET, Marc

Jornalismo, o quarto poder, Editora Brasiliense, São Paulo, 1986

PIVETEAU, Jacques

L'Extase de la Télévision, insep editions, Paris, 1984

PUDOVKIN, Vsevolod

Argumento e Realização, Editora Arcádia, Lisboa, 1961

RABAÇA, C. A e BARBOSA, G.

Dicionário de Comunicação, Editora Ática, S.A., São Paulo, 1987

RIZZINI, Carlos

O Jornalismo antes da Tipografia, Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1977

RODRIGUES, Adriano Duarte

Estratégias da Comunicação - Questão Comunicacional e Formas de Sociabilidade, Editorial Presença, Lisboa, 1990

A Comunicação Social, Editorial Vega, Lisboa, sem data

O campo dos media, A Regra do Jogo, Edições, 1984

ROSSI, Clóvis

O que é o Jornalismo, Brasiliense, São Paulo, 1980

SCHAEFFER, Pierre

Les Machines à Communiquer, Éditions du Seuil, Paris, 1970

SCHILLER, Herbert I.

O Império Norte-Americano das Comunicações, Editora Vozes, Petrópolis, 1976

The Mind Managers, Beacon Press, Boston, 1972

SCHRAMM, Wilbur

The Process of Effects of Mass Communication, University of Illinois Press, Chicago, 1972

SCHWART, Tony

The Responsive Chord, Anchor Press/Doubleday, New York, 1973

Mídia: O Segundo Deus, Summus Editorial, São Paulo, 1985

SERVAN-SCHREIBER, Jean-Louis

O poder da informação, Publicações Europa-América, Lisboa, 1974

SOLER, Llorenç

La Televisión - una metodologia para su aprendizage, Editorial Gustavo Gilli, S.A., Barcelona, 1988

TÁVOLA, Artur da

Comunicação é mito, Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1985

TEODORO, Gontijo

Jornalismo na TV, Editora Tecnoprint, S.A., Rio de Janeiro, 1980

THIBAU, Jacques

Une Télévision pour tous les Français, Éditions du Seuil, Paris, 1970

TORÁN, L. Henrique

La Informacion en TV, Editorial Mitre, Barcelona, 1982

WATTS, Harris

On Camera, Summus Editorial, São Paulo, 1990

WATZLAWICK, Paul

A realidade é real ?, Relógio D'Água, Lisboa, 1991

WENDERS, Wim

A Lógica das Imagens, Edições 70, Lisboa, 1990

WOODROW, Alain

Informação, Manipulação, Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1991

WOLF, Mauro

Teorias da Comunicação, Editorial Presença, Lisboa, 1987

WOLFE, Tom

The new journalism, Picador, London, 1975

WRIGHT, Charles R.

Comunicação de Massa, Edições Bloch, Rio de Janeiro, 1973

VATTIMO, Gianni

A Sociedade Transparente, Relógio D'Água, Lisboa, 1992

VERTOV, Dziga

El Cine-Ojo, Textos e Manifiestos, Editorial Fundamentos, Madrid, 1973









  • Foto do escritor: Jorge Campos
    Jorge Campos
  • 8 de abr. de 2021
  • 21 min de leitura

Publicado há 30 anos, penso que este meu livrinho chamado A Caixa Negra continua a ser pertinente. Na verdade, tendo sido escrito para estudantes a iniciar o Curso de Jornalismo na área da Televisão, tem algo que me parece de elementar precaução. Alerta para as ilusões dos jovens em torno deste medium fascinante e discute questões essenciais como a manipulação e a propriedade dos meios de comunicação social numa sociedade, já nessa altura, confrontada com aquilo a que chamei uma crise das representações. Também nele se reclama ser indispensável entender o Cinema de modo a poder melhor entender a linguagem da Televisão, hoje algo totalmente negligenciado. Este texto corresponde ao capítulo IV de A Caixa Negra intitulado O I(ni)maginável Mundo Novo e antecipa algumas das coisas que por aí estão. Prepara, também, o seguinte e último capítulo chamado O Insustentável Peso do Lixo.



Fonte: Reason Magazine

O INIMAGINÁVEL

acontece. Nos Estados Unidos, estações de Televisão por cabo vocacionadas para a venda de objectos ao domicílio através de concursos ameaçam as audiências das grandes networks, por vezes, ultrapassam-nas. É a lógica do consumismo na sua irracionalidade. É a vitória do consumo pelo consumo, sem distinção dos produtos adquiridos em função da sua utilidade. Um dinossauro de plástico amarelo é especialmente disputado, um crocodilo de peluche leva os lares americanos ao rubro.


Por cá, ainda não chegou o cabo nem chegaram estas modalidades de canais especializados, o que não quer dizer que os concursos não tenham singrado. Bem pelo contrário. As tabelas de audiências atribuem já os lugares cimeiros a alguns concursos à frente, por exemplo, das telenovelas, do desporto e das notícias.


Lá, como cá, como um pouco por todo o mundo, o concurso não põe qualquer exigência de aprendizagem intelectual. É puro entretenimento construído à volta de uma ideia central, o dinheiro, e encenado por forma a resultar em termos minimamente espectaculares. É barato e rentável. Acertar no preço de um produto, por exemplo, exige apenas um mínimo de bom senso e, provavelmente, um máximo de frequência dos hipermercados, aliados à disponibilidade interiorizada de alimentar um flirt regular com os objectos. Voyeur de quase tudo, como quase toda a gente, o concorrente encontra na contemplação dos objectos satisfação para uma parte significativa das necessidades do seu imaginário e no concurso a possibilidade de objectivar o seu desejo, transformando--se em protagonista de uma aventura vivida por milhões diante de ecrãs de televisão que com ele arriscam na sorte de um lance o acesso a um efémero momento de glória.


Claro que, de um modo geral, o espectador nem sequer se apercebe que os prémios realmente gordos são puro engodo e, como tal, destinam-se a ser parcimoniosa e episodicamente distribuídos. Quanto ao mais, salvo raras excepções, ao participante incomoda interrogar, explorar ou analisar. De resto, nem para tal é solicitado mesmo quando o concurso, aparentemente, aponta para uma intervenção cultural, no sentido da participação criadora e da partilha de conhecimentos. Escrevendo a propósito dos concursos radiofónicos com objectivos supostamente culturais, Baudrillard comenta:


"O que é repartido deixa de ser 'cultura'; o corpo vivo, a presença actual do grupo (tudo o que fazia a função simbólica e metabólica da festa) já não é um saber no sentido próprio do termo; é o estranho corpo de signos e referências, de reminiscências escolares e de signos intelectuais da moda a que se dá o nome de 'cultura de massas' e que poderá igualmente chamar-se M.C.C. (Menor Cultura Comum), no sentido do menor denominador comum em aritmética — no sentido, também, do 'standard package', que define a menor panóplia comum de objectos a possuir pelo consumidor médio para aceder ao título de cidadão da sociedade de consumo. Assim, também a M.C.C. define a menor panóplia comum de 'respostas justas' que se supõe possuir o indivíduo médio para alcançar a patente de cidadania cultural".(1)


Será razoável alargar este menor denominador cultural comum em termos de uma elaboração tipificadora do espectador médio de Televisão? E haverá, de facto, um espectador médio? É uma questão controversa com repercussões tanto no plano da linguagem, na medida em que problematiza a codificação da mensagem em função de um determinado receptor (o espectador - consumidor), quanto no plano da actividade jornalística, a qual se inscreve no quadro global da interacção entre o fazer televisivo e a sociedade no seu conjunto.


UMA CORRIDA PARA A FRENTE


Tecnicamente, a Televisão é o resultado da conjunção e da interpenetração de três séries de descobertas: da foto-electricidade, ou seja, da capacidade de certos corpos transformarem, por radiação de electrões, a energia eléctrica em energia luminosa; do processo de análise de fotografias decompostas e, depois, recompostas em linhas de pontos claros e escuros; e, por fim, do domínio das ondas hertzianas para efeito da transmissão de sinais eléctricos correspondentes a cada um dos pontos da imagem analisada.


John Logie Baird e o seu modelo original de televisão. Foto: TIME

Não cabe aqui fazer a história da Televisão. Retenham-se, porém, os nomes de dois pioneiros, porventura os principais protagonistas das duas principais vias de análise das imagens: a da varredura mecânica por um feixe luminoso, derivada do disco de Nipkov, e a da varredura por um feixe de electrões derivada dos trabalhos de Rosling. Um desses pioneiros foi o escocês John Logie Baird. Excêntrico, visionário, adivinhou a Televisão do futuro falhando, embora, na sua tentativa de transmissão mecânica de imagens. Foi de curta duração o programa que chegou a ter na fase experimental da BBC. O outro pioneiro teve melhor sorte ao apostar na electrónica. Foi o russo Vladimir Zworykin. Após uma longa estadia em França, acabou por se radicar nos Estados Unidos onde, em 1927, construiu o seu famoso iconoscópio, com o qual passaram a ser equipadas as máquinas fotográficas, e que permitiu o aperfeiçoamento dos tubos de raios catódicos dos receptores de televisão.


No seguimento dos trabalhos de Zworykin poder-se-iam citar muitos nomes. Para o nosso propósito é suficiente referir que os progressos foram rápidos, mas o início da II Guerra Mundial interrompeu as experiências então em curso. Importa, contudo, sublinhar o seguinte. Apesar de habituados às mutações técnicas com impacto civilizacional, a sociedade contemporânea parece ter estranhado a velocidade da mudança mediática. Fora preciso século e meio para que os jornais nascessem do invento de Gutenberg, mas vinte anos tinham bastado para que a TSF conduzisse à radiodifusão pública e, menos de dez anos após os primeiros ensaios, já a Televisão principiara a funcionar. A amplitude da expansão dos meios eléctricos levou historiadores da comunicação a afirmar que eles nunca encontraram o seu equilíbrio na estabilidade:


"Impelidos sem cessar para um maior desenvolvimento pelos progressos da técnica e pelo dinamismo dos interesses comerciais e políticos que os apoiam, cresceram e diversificaram-se numa espécie de corrida para a frente cujo objectivo é bem incerto."(2)


Vladimir Zworykin e o seu protótipo. Fonte: Russkiy Mir Foundation

No caso da Televisão, os anos 80 vieram confirmar essa incerteza. Foram os anos de desregulamentação no quadro de um mercado cada vez mais concorrencial e, porque não dizê-lo, à beira da saturação. A tal ponto que a década de 90, na Europa, principiou com nítidos sinais de recessão, enfrentando boa parte das televisões generalistas sérias dificuldades financeiras. Sob pressão da concorrência, os serviços públicos resvalaram para uma zona de alta indefinição quanto às pressões do poder político, transformando-se em gigantescos aparelhos de controle social. É uma ideia para ser desenvolvida adiante e que encontra nas notícias um dos seus aspectos mais perturbadores, posto que elas não só legitimam o discurso político dominante, como tendem a substituir-se ao acontecimento, transformando-se, elas próprias no acontecimento. Roberto Marinho, o magnate da televisão brasileira chega ao ponto de afirmar que, hoje em dia, os conceitos de História e Jornalismo mantém total afinidade.


Dir-se-á que a Televisão é apenas um dos media e argumentar-se-á com a sua complementaridade para efeito da formação da opinião pública. Ainda assim, seria insensato desvalorizar o peso específico da Televisão, muitas vezes a única fonte de informação e entretenimento para um número substancial de pessoas. Aliás, a corrida para a frente em que a Televisão continua envolvida põe questões suficientemente sérias para merecerem a atenção de diversos organismos, como o European Television Task Force e o European Institute for the Media, parecendo ganhar força a ideia de que a qualidade da democracia tem uma relação directa com o modo de operar dos seus meios de comunicação social. Ora, é justamente em torno deste problema, afinal o problema da cidadania, que se levanta o maior número de interrogações. Vejamos algumas.


PROPAGANDA E ESTEREÓTIPOS


A propaganda política visa, fundamentalmente, a conquista e a preservação do poder. É uma comunicação persuasiva, alicerçada num conjunto de técnicas de informação, destinada a influenciar as opiniões, os sentimentos e as atitudes do público num determinado sentido. É, portanto, uma acção planeada e racional.


Sobretudo a partir dos anos 60, a Televisão substituiu a Rádio com vantagem, tanto no plano da chamada propaganda de competição, como de propaganda de integração.


Fonte: Shutterstock

A propaganda de competição é um mecanismo de mudança social e de transformação política, num quadro de consensualidade adquirida, visando a conquista, por meio do prestígio,


"de uma maioria flutuante de um corpo político, de um agrupamento ou de um mercado. O consenso traduz-se no facto de o prestígio reconhecido por uma maioria constituir lei aceite pela minoria. O prestígio temporário adquirido através da propaganda substitui o confronto físico, a pura relação de forças."(3)


A propaganda de competição inscreve-se no curto prazo e tem afinidades com a publicidade, manifestando-se, por exemplo, durante as campanhas eleitorais.


A propaganda de integração é de longo prazo. Baseia--se nos valores transmitidos de geração em geração através de factores como a família, a escola, as convicções religiosas, e apoia--se na memória colectiva, confrontando os infractores da norma com a ameaça de reprovação. Este tipo de propaganda tornou-se organizada e ideológica; assumindo um controle crescente sobre os mass media, em especial sobre os jornais televisivos.


Em qualquer dos casos, sendo de competição ou de integração, a propaganda procede de simplificações. Walter Lippmann(4) afirma que o indivíduo, incapaz de interpretar o mundo em toda a sua complexidade, cria para seu uso modelos sustentados por estereótipos. A teoria de Lippmann, que tem servido de base a muitos estudos sobre a propaganda, identifica o mundo estereotipado como substituto da realidade existente. Esta ilusão, segundo Biriukov, é configurada a partir do momento em que os estereótipos são, essencialmente,


"uma espécie de aceleradores do conhecimento, que ajudam um indivíduo a formar uma ideia de um objecto ou de um fenómeno, antes de ele entrar em contacto com eles. Desta forma, os estereótipos combinam-se para formarem imagens, que pavimentam o caminho que leva à manipulação directa da opinião pública."(5)


Entramos, assim no domínio da


INDÚSTRIA DA CONSCIÊNCIA.


Os gestores dos media, segundo Herbert Schiller,


”criam, processam, refinam e presidem à circulação de imagens e informações, que determinam as nossas crenças e atitudes e, em última instância, o nosso comportamento. Quando produzem deliberadamente mensagens que não correspondem à realidade da existência social, os gestores dos media tornam-se gestores das mentes. As mensagens que criam intencionalmente um falso sentido da realidade e produzem uma inconsciência que não permite compreender ou rejeitar livremente as actuais condições da vida pessoal e social são mensagens manipuladoras.(6)


Herbert Schiller

Em sentido lato, manipulação significa uma técnica de mudança da consciência sem que disso o manipulado se aperceba. A eficácia manipulatória obtém-se accionando determinados mecanismos psicológicos num quadro de estereótipos da realidade. Em relação aos Estados Unidos, por exemplo, Schiller identifica cinco mitos estruturantes dos media. São eles os mitos do individualismo e da escolha pessoal, da neutralidade, da natureza humana imutável, da ausência de conflito social e do pluralismo dos mass media. Por analogia, poder-se-iam determinar os mitos que noutras circunstâncias históricas correspondem a outras realidades. No caso das televisões do Estado, com forte vínculo governamental, é fácil identificar os estereótipos conducentes à construção do mito da eficácia ou do mito da estabilidade, um e outro indispensáveis à consolidação das estratégias do poder. Mas o que é, afinal, a função do mito?


O MITO


Dois parágrafos de Roland Barthes permitem dar resposta à questão. Segundo ele,


"a função do mito é transformar uma intenção histórica em natureza, uma contingência em eternidade. Ora, este processo é o próprio processo da ideologia burguesa. Se a nossa sociedade é objectivamente o campo privilegiado das significações míticas, é porque o mito é formalmente o instrumento mais apropriado para a inversão ideológica que a define: a todos os níveis da comunicação humana, o mito realiza a inversão da anti--physis em pseudo-physis."(7)


Prossegue Barthes:


"O que o mundo fornece ao mito é um real histórico, definido, por mais longe que recue no tempo (...) e o que o mito restitui é uma imagem natural deste real (...). Uma prestidigitação inverteu o real, o seu sentido humano, de modo a fazê-lo significar uma insignificância humana."(8)



Roland Barthes

CONTROVÉRSIAS


É certo que a abordagem da manipulação, mitos e estereótipos, exige a aceitação do pressuposto da existência de um fenómeno de massificação promovido pelos mass media e assenta, até, na convicção de que a cultura de massa é um dos expoentes referenciais das sociedades modernas. Há quem, contudo, rejeite este ponto de vista, reduzindo os conceitos de massa e de cultura de massa, eles mesmos, à categoria de mitos construídos a partir de elaborações teóricas insuficientemente testadas ou resultantes de leituras essencialmente ideológicas. No fundo, trata-se da velha querela, sempre emergente da problemática dos media, que opõe optimistas a pessimistas. Orlando Miranda, por exemplo, afirma que todo o mito procura impor uma crença, ao serviço de uma ideologia. Nessa perspectiva,


"o mito da massa recusa possibilidade às acções colectivas, e propõe como substitutas fugas individuais (para as quais os media fornecem os meios). O mito da massa nega racionalidade à consciência colectiva, e a nega também ao indivíduo por ser uma consciência socialmente condicionada. Numa palavra, o mito da massa nega o próprio homem que, animalizado, deve conformar-se à sua pseudo-condição de objecto histórico."(9)


A dinâmica das sociedades modernas, na sua intensa mutabilidade, impõe um permanente questionar de dados adquiridos, relevando a sua transitoriedade. Como tal, é indispensável introduzir a controvérsia nestas matérias, já de si tão contraditórias, e que nos devolvem às interrogações abertas no início do capítulo a propósito da viabilidade de caracterização de um espectador médio de Televisão. Seja como for, é difícil negar, em maior ou menor extensão, a existência de massificação induzida pelos media. O próprio Miranda não nega esse fenómeno, afirmando, embora, que ele se explica pela multi - significação do produto e não pela padronização do consumidor.


Fonte: Sites at Penn State

Nesse sentido, talvez não seja possível fazer o retrato robot do espectador médio, mas é certamente possível expor alguns dos traços característicos dessa massificação, em relação à qual, de resto, o Estado está longe de ser um presumível inocente. Há dados que decorrem da constatação de factos. Quando se estabelece, por exemplo, uma relação directa entre o exercício do poder político e o controle das televisões estatais, mais não se faz do que admitir o óbvio. Como óbvio é o facto de qualquer poder exercido através dos media ser massificador. É este tipo de relações, aliás, que leva Maurice Duverger a afirmar:


"O poder da Televisão é tal que se não se adapta o seu regime às estruturas políticas do Estado, são as estruturas políticas do Estado que se adaptarão ao regime da Televisão."(10)


E Duverger acrescenta:


"A contradição tornar-se-á insolúvel entre uma TV governamental e um sistema democrático, de sorte que a primeira acabará por esvaziar o segundo de toda a sua substância."(11)


E é por aqui que se entra no mundo das


MÁSCARAS


Com efeito, a Televisão surge como um autêntico aparelho ideológico do Estado, em última instância um prolongamento do poder político e, enquanto tal, agente da História com a qual se confunde no seu fazer quotidiano. Sendo assim, o campo informativo recolhe a ambiguidade resultante da sobreposição do político e do jornalístico. O político necessita da máscara do jornalismo para credibilizar a informação, mas retira-lhe autonomia por forma a fazer passar sem sobressaltos a sua mensagem numa combinação mais ou menos hábil de formas de propaganda de competição e de integração. Esta, regula a direcção estratégica do discurso de acordo com os mitos e estereótipos da dominação, aquela, introduz o indispensável elemento de conflitualidade (razoável) de modo a manter sob abertura controlada os canais de circulação de ideias sem os quais as sociedades tendem ao enclausuramento, asfixia e morte, como aconteceu nos países comunistas do leste europeu. De resto, sendo coisas diferentes, a manipulação e o condicionamento, para serem eficazes, não podem manifestar-se como tal, sob pena de produzirem um efeito de boomerang por perda de credibilidade junto do receptor. Daí, uma vez mais, o recurso à máscara.


De passagem, importa acrescentar que a "propaganda informativa" é enquadrada pelo conjunto da programação televisiva, ela mesma uma "propaganda global". Como sublinhou McLuhan(12), já não faz sentido a transmissão de mensagens de conteúdo obviamente propagandístico através dos media. Importa, sim, valorizar a importância da totalidade cultural, diversa a ponto de integrar a língua, a alimentação, a publicidade, o entretenimento, etc.. Vão longe os Dias da Rádio, a Guerra das Ondas e a Teoria da "agulha hipodérmica" na sua formulação inicial.


Fonte: Quora

O QUE O PÚBLICO QUER


O controle do emissor sobre as mensagens veiculadas é, entretanto, justificado com alegadas preferências do público. Por outras palavras, o emissor só é responsável por aquilo que emite na medida em que o receptor o exige. É a ditadura dos índices de audiência. Comentando a violência que inunda a Televisão americana, Schiller afirma:


"A programação diária (...) com a sua média de seis homicídios por hora, é facilmente justificada pelos controladores dos media como um esforço para dar às pessoas o que elas querem. É muito mau, dizem encolhendo os ombros, mas a natureza humana exige dezoito horas diárias de mutilações e morticínios."(13)


Tal como Schiller, também Richeri contesta o critério das audiências:


"De um modo geral, não me parece que sejam os gostos do público que tenham determinado, até ao momento, a oferta televisiva, pelo contrário tem sido a oferta televisiva que tem formado o gosto do público. Com a passagem da televisão de serviço público a televisão comercial, passa-se substancialmente de uma "pedagogia institucional" a uma "pedagogia dos consumos", mas embora mudem os conteúdos da programação é sempre o emissor quem decide, entre todas as possibilidades, o que há-de transmitir. O público nunca tem a possibilidade de saber quais poderiam ter sido as alternativas e nunca pode promovê-las."(14)


O emissor aparece, assim, com um papel determinante no


CONTROLE DA EMISSÃO,


assumindo um lugar de destaque nos novos paradigmas da comunicação. Se tomarmos como ponto de partida o esquema de Lasswell, verificaremos que das cinco grandes linhas de pesquisa por ele enunciadas — control analysis, content analysis, media analysis, audience analysis e effects analysis — a primeira e a última adquirem uma relevância renovada. Após as tentativas, aliás, bem sucedidas, de provar a relatividade da influência dos media, caso das teorias dos "efeitos limitados" e da "persuasão" (às quais já fizemos referência) e da marginalização da teoria da "agulha hipodérmica", assiste-se, agora, a uma revalorização desta última, bem como do poder exercido no conjunto da sociedade pelos meios de comunicação de massa. Um dos textos que assinala esta mudança intitula-se, significativamente, "Return to the Concept of Powerful Mass Media ", da autoria de Noelle Neuman.(15)


Elisabeth Noelle Neuman

Volta, portanto, a estabelecer-se uma relação entre quem controla os mass media e quais os efeitos pretendidos. Agora, porém, em vez de se estudarem casos singulares, optou-se pela cobertura global de todo o sistema mediático, substituindo-se o recurso às técnicas tradicionais, como as entrevistas, por metodologias integradas. Já não estão tanto em causa as mudanças de atitude e de opinião, mas sim a reconstrução do processo através do qual o indivíduo modifica a sua própria representação da realidade social. Investigam-se, assim, "os sistemas de conhecimento que o indivíduo assume e estrutura de uma forma estável devido ao consumo que faz das comunicações de massa"(16), mudando, concomitantemente, o quadro temporal da pesquisa. Ou seja, os efeitos pontuais ligados à exposição à mensagem dão lugar aos efeitos cumulativos, sedimentados no tempo.


É o que afirmam Lang e Lang a propósito da competição eleitoral:


"Os mass media (...) exercem a influência que têm na medida em que são algo mais do que um simples canal através do qual a política dos partidos é apresentada ao eleitorado. Ao filtrar, estruturar e realçar determinadas actividades públicas, o conteúdo dos mass media não se limita a transmitir aquilo que os porta-vozes proclamam e aquilo que os candidatos afirmam (...) Não só durante a campanha mas também nos períodos intermédios, os mass media fornecem perspectivas, modelam as imagens dos candidatos e dos partidos, ajudam a promover os temas sobre os quais versará a campanha e definem a atmosfera específica e a área de relevância e de reactividade que assinala cada competição eleitoral."(17)


Evidentemente, a passagem dos "efeitos limitados" para os "efeitos cumulativos" implica a substituição do modelo transmissivo da comunicação por um modelo centrado no processo de significação. Este é já o domínio da

AGENDA-SETTING,


a qual sustenta que


"em consequência da acção dos jornais, da televisão e dos outros meios de informação, o público sabe ou ignora, presta atenção ou descura, realça ou negligencia elementos específicos dos cenários públicos. As pessoas têm tendência para incluir ou excluir dos seus próprios conhecimentos aquilo que os mass media incluem ou excluem do seu próprio conteúdo. Além disso, o público tende a atribuir àquilo que esse conteúdo inclui uma importância que reflecte de perto a ênfase atribuída pelos mass media aos acontecimentos, aos problemas, às pessoas."(18)



Por outras palavras, os mass media, ao descreverem e precisarem a realidade exterior, apresentam ao público uma lista em torno da qual é possível formar uma opinião ou ter uma discussão. Afirma Grossi:


"Nas sociedades industriais de capitalismo desenvolvido, em virtude da diferenciação e da complexidade sociais e, também, em virtude do papel central dos mass media, foi aumentando a existência de fatias e de 'pacotes' de realidade que os indivíduos não vivem directamente nem definem interactivamente a nível da vida quotidiana, mas que 'vivem', exclusivamente, em função de ou através da mediação simbólica dos meios de comunicação de massa."(19)


Eis-nos, pois, chegados onde queríamos chegar: a construção da realidade.


Obviamente, é esta possibilidade de fabricar a realidade que torna a Televisão tão apetecível ao poder político. Havendo uma relação directa entre o regime de propriedade e as estratégias discursivas, é fácil perceber que a Televisão pode transformar-se num instrumento de propaganda caso pertença ao Estado e não disponha de um estatuto de serviço público, claramente definido, que a autonomize da esfera governamental.


Nos países comunistas do leste europeu a situação não se prestava a equívocos:


"A sociedade socialista atribui abertamente aos seus meios de informação e de propaganda de massas a tarefa de defenderem ideologicamente o socialismo e de orientarem a opinião pública na direcção justa. A informação e propaganda são as principais componentes das actividades ideológicas da sociedade socialista."(20)


Esta perspectiva burocrática, que atribuía aos media uma função meramente instrumental ao serviço da ideologia, teve os resultados que teve. Aliás, muito tempo antes da derrocada dos regimes herdeiros do estalinismo, era já evidente a falta de credibilidade do seu universo mediático junto dos cidadãos. No ocidente, a chamada democracia liberal teve o mérito de criar um sistema no qual são autorizadas expressões alternativas no campo dos media. Não quer isso dizer, no entanto, que o modelo funcione na perfeição. Na verdade, até alberga no seu seio muitas ambiguidades. A título de exemplo, vejamos


O TELEJORNAL SEGUNDO UMBERTO ECO,


Redigido numa altura em que o escritor manteve uma divertida polémica com a Televisão italiana. Insurgindo-se contra o carácter tendencioso dos noticiários, Eco elaborou um decálogo humorístico contendo as regras da manipulação da informação política. Esse decálogo tem sido publicado por diversas vezes e pode resumir-se do seguinte modo:


Fonte: Quartz

A primeira regra da manipulação é não comentar senão o que se pode ou deve comentar, porque — e esta é já a segunda regra — a informação verdadeiramente orientada não tem necessidade de comentários, baseando-se na escolha de adjectivos e num jogo de contraposição. A terceira regra aconselha, em caso de dúvida, a optar pelo silêncio, eliminando as informações incómodas. Há, depois, outras regras, como sejam: colocar a notícia importuna onde já ninguém a espera, de preferência num tempo de exposição rápido e sem imagens significativas; utilizar linguagem técnica, incompreensível para a maioria do público, mas reveladora da superioridade dos conhecimentos de quem a utiliza, dissuadindo a crítica; só fornecer informação completa quando a imprensa diária a tiver já difundido. A sétima regra é a da submissão ao poder e de prescrever o compromisso só se o governo se tiver já comprometido, sendo indispensável a intervenção de um ministro. Vêm, finalmente, as regras de valorização dos assuntos, que fecham o decálogo: apresentar oralmente as notícias importantes; considerar como uma obrigação a filmagem do que não tem qualquer interesse; e, só mostrar as coisas importantes se elas ocorrerem no estrangeiro.


Esta paródia, sendo o que é, nem por isso deixa de colocar o dedo na ferida de muita da informação televisiva. Uma vez mais, parece legítimo inferir que da convergência do político e do jornalismo resulta um produto ambíguo, ressoando a propaganda camuflada. Na prática, situações decorrentes do decálogo de Eco levantam não poucos problemas aos jornalistas. Às vezes, são pequenos detalhes, aparentemente insignificantes, que fazem as grandes coisas e as grandes causas. Eric Nepomuceno, da Rede Globo de Televisão, relata um episódio curioso a propósito de


"SOMOZISTAS" E "REBELDES":


"Fui contratado quando ainda morava no México e a ideia era participar do projecto de desenvolver mais o noticiário relacionado à América Latina. (...) Na quarta ou quinta semana de trabalho, fui chamado pelos responsáveis pelos noticiários e ouvi um pedido um tanto constrangedor: 'Não use mais a palavra somozista quando se referir ao pessoal da Guardia Nacional que luta contra os sandinistas'. O pedido veio acompanhado por uma explicação: 'É que somozista é um termo pejorativo, seria editorializar a notícia. O correcto é usar rebeldes.' Fiz então um extenso relatório explicando quem era quem nos grupos armados instalados em Honduras, na Costa Rica e na Flórida. Expliquei que a maioria se autoclassificava de somozista, da mesma maneira que décadas antes havia quem se definisse como nazista, fascista, franquista, salazarista, etc., sem achar que isso fosse pejorativo. Depois de muita discussão, autorizaram que a palavra maldita fosse usada — Mas só no Jornal da Globo, que era exibido por volta da meia-noite, uma audiência considerada 'qualificada'. No Jornal nacional, não: a palavra tinha mesmo de ser rebeldes nicaraguenses."(21)


Este episódio, e outros semelhantes — todos os dias as redacções têm histórias a contar — ocorre no contexto da criação de um universo audiovisual, sobre o qual há pontos de vista muito diversificados. Está-se, na verdade, perante um


MUNDO NOVO,


nem sempre admirável, mas de perspectivas tão aliciantes quanto contraditórias.

Os optimistas valorizam a capacidade do homem para superar os constrangimentos induzidos pela massificação através da inteligência e criatividade, uma e outra estimuladas tanto por uma incessante inovação tecnológica dos meios electrónicos quanto pela revolução micro-informática. Prospectivamente, definem o perfil de uma sociedade de sujeição das máquinas à vontade do homem, uma sociedade desmassificada por via da utilização generalizada dos self--media.



Menos especulativos, os pessimistas partem de uma avaliação de dados cujos efeitos levam a temer um fenómeno de massificação sem precedentes, não apenas nos países onde a Televisão é o principal e, por vezes, único, meio de informação e entretenimento, mas também nos países mais avançados, como os Estados Unidos. Daí vêm, de resto, os principais sinais de alerta e as críticas mais contundentes.


Project Censored é uma organização americana vocacionada para o estudo e crítica dos media, especialmente preocupada com as diversas formas de censura. Todos os anos Project Censored elege os dez assuntos mais censurados pelos meios de comunicação. Os resultados respeitantes a 1989 projectaram para os lugares cimeiros da tabela as notícias respeitantes ao controle crescente dos media por um número cada vez menor de corporações gigantescas.


Ben H. Bagdikian, ex-chefe de redacção do Washington Post e ex-director da Escola de Jornalismo da Universidade de Berkeley, num estudo largamente fundamentado, chega à conclusão de que "os senhores da aldeia global têm a sua própria agenda política e resistem a quaisquer mudanças económico-sociais que não se ajustem aos seus interesses financeiros."(22) Escreve Bagdikian:


"Juntos, eles exercem um poder homogeneizante sobre as ideias, a cultura e o comércio que afecta as maiores populações de que se tem conhecimento desde sempre. Nem César, nem Hitler, nem Franklin Roosevelt e nem qualquer papa tiveram tanto poder como eles para moldar a informação da qual tantas pessoas dependem para tomar decisões sobre as mais variadas matérias — desde em quem votar, até ao que comer."(23)


Quando saiu a primeira edição do livro de Bagdikian, eram apontados os nomes de cinquenta empresas detentoras do controle da maioria da produção mediática mundial. Pouco tempo depois, ao sair a segunda edição, o autor foi obrigado a anotar no prefácio que esse número se tinha reduzido para vinte e nove. E, hoje, são ainda menos.


Fonte: Interwebz

Outra obra de grande impacto nos Estados Unidos é "Manufacturing consent: The political economy of the mass media" da autoria de dois professores universitários, Edward S. Herman e Noam Chomsky. Os autores não se coibem de chamar ao modelo da Televisão americana "um modelo de propaganda".(24) Segundo eles são os poderosos que estabelecem as premissas do discurso, estabelecendo o que é permitido ao público ver, ouvir e pensar.


A leitura das duas obras mencionadas levou o escritor Gore Vidal, com a irreverência habitual, a escrever:


"Os dois estudos demonstraram exactamente como uns poucos manipulam a opinião pública; para início de conversa, a casa do americano médio mantém o televisor ligado sete horas por dia. Isso significa que o americano médio já viu 350 mil comerciais ao chegar aos dezassete anos. Como a opinião da maioria é controlada agora por vinte e nove corporações, conclui-se que os vinte e nove chefes executivos são uma espécie de politburo ou colégio de cardeais, encarregados daquilo que o povo deve ou não pensar. Além disso, eles escolhem os presidentes e o Congresso — ou, para ser preciso, determinam até sobre o que os políticos podem falar em período de campanha eleitoral."(25)


É caso para dizer: Big Brother is watching you!




(Continua)


Notas remissivas


1. BAUDRILLARD, Jean

A Sociedade de Consumo, Edições 70, Lisboa, 1981

2. ALBERT, P. e TUDESQ, A.J.

História da Rádio e Televisão, Editorial Notícias, Lisboa, sem data

3. NAMER, Gérard in Guia Alfabético das Comunicações de Massa, Propaganda, Edições 70, Lisboa, sem data

4. LIPPMANN, Walter

Public Opinion, MacMillan, New York, 1921

5. BIRIUKOV, N. S.

A Televisão no Ocidente e as suas Doutrinas, edições Avante!, Lisboa, 1987

6. SCHILLER, H. I.

The Mind Managers, Beacon Press, Boston, 1972

7. BARTHES, Roland

Mitologias, Edições 70, Lisboa, 1984

8. Ibidem

9. MIRANDA, Orlando

Tio Patinhas e os Mitos da Comunicação, Summus Editorial, São Paulo, 1976

10. Duverger é aqui citado a partir de um ensaio de Francisco Rui N. Cádima, "Notícia do Mundo e de lado nenhum Ou a ilusão naturalista da informação televisiva", publicado na Revista de Comunicação e Linguagens nº8 de Dezembro de 1988

11. Ibidem

12. McLuhan é citado por Julian Hale — La radio como arma política — a partir de A. Briggs, A History of Broadcasting in the United Kingdom, Oxford University Press, Londres, 1970

13. SCHILLER, H. I.

The Mind Managers, Beacon Press, Boston, 1972

14. SOLER, Llorenç

La Televisión — una metodologia para su aprendizage, Editorial Gustavo Gilli, S.A., Barcelona, 1988. Nesta obra, o professor Giuseppe Richeri, entrevistado pelo autor, avança uma ideia interessante sobre o que, em seu entender, deveria ser a Televisão do futuro. Diz ele: "É inevitável, (...), que sejam os profissionais a fazer a televisão, mas creio que os protagonistas dessa televisão não deveriam ser exclusivamente personagens 'excelentes' (peritos, artistas, líderes políticos e sindicais, etc.); o novo sentido de acesso do público deveria ser o de colocar no centro da informação televisiva os protagonistas da vida real que se desenvolve nos lugares de trabalho, de investigação, de estudo e de tempos livres."

15. WOLF, Mauro

Teorias da Comunicação, Editorial Presença, Lisboa, 1987

16. Ibidem.

A citação é de Lang e Lang, reproduzida por Wolf que afirma que no centro da problemática dos efeitos se coloca, hoje, a relação entre a acção constante dos mass media e o conjunto de conhecimentos acerca da realidade social, que dá forma a uma determinada cultura e que sobre ela age, dinâmicamente. Nessa relação devem destacar-se três características dos meios de comunicação social: a acumulação, a consonância e a omnipresença, todas elas definidas por Noelle Neuman. A primeira está ligada à capacidade dos mass media criarem e manterem a relevância de um tema, através de repetições contínuas, como acontece em especial no campo da informação televisiva. A segunda associa-se ao facto das semelhanças existentes nos processos produtivos da informação serem mais significativos que as diferenças, "o que conduz a mensagens substancialmente mais semelhante do que dissemelhantes". A terceira respeita não apenas à difusão quantitativa dos mass media, mas também ao facto de o saber público ter um carácter particular: "é do conhecimento público que esse saber é publicamente conhecido." Conclui Wolf: "Isso reforça a disponibilidade para a expressão e para a evidência dos pontos de vista difundidos pelos mass media, e daí o poder que essa evidência tem sobre aqueles que não formaram ainda uma opinião própria. O resultado final é que, muitas vezes, a repartição efectiva da opinião pública se regula pela opinião reproduzida pelos mass media e se adapta a ela, segundo um esquema de conjecturas que se autoverificaram."

17. Ibidem

18. Ibidem

19. Ibidem

20. BIRIUKOV, N. S.

A Televisão no Ocidente e as suas Doutrinas, edições Avante!, Lisboa, 1987

21. NEPOMUCENO, Eric in Rede Imaginária, Secretaria Municipal de Cultura, Companhia das Letras, São Paulo, 1991

22. FERREIRA, Argemiro in Rede Imaginária, Secretaria Municipal de Cultura, Companhia das Letras, São Paulo, 1991

23. Ibidem.

Citado por Ferreira, Bagdikian adverte: "Aquilo que chega ao conhecimento do público é largamente influenciado pelo que serve aos interesses económicos e políticos das corporações proprietárias dos media. Como os seus donos estão agora tão ampla e profundamente envolvidos nos mais altos escalões da economia, as notícias e demais informações públicas ficam grandemente desiquilibradas em favor dos valores das corporações."

24. Ibidem

25. Ibidem


102894510_3442382629123473_1706644122050382510_n.jpg
Jorge Campos

arquivo

        "O mundo, mais do que a coisa em si, é a imagem que fazemos dele. A imagem é uma máscara. A máscara, construção. Nessa medida, ensinar é também desconstruir. E aprender."  

120048145_341823260208071_74511127798334

Receba a Newsletter de NDR diretamente na sua caixa de email

Ouvir

Ver, Ouvir & Ler

Ler

C A T E G O R I A S

Ensaios, conferências, comunicações académicas, notas e artigos de opinião sobre Cultura. Sem preocupações cronológicas. Textos recentes  quando se justificar.

Iluminação Camera

 

Ensaios, conferências, comunicações académicas, textos de opinião. notas e folhas de sala publicados ao longo de anos. Sem preocupações cronológicas. Textos recentes quando se justificar.

Estático

Arquivo. Princípios, descrição, reflexões e balanço da Programação de Cinema, Audiovisual e Multimédia do Porto 2001-Capital Europeia da Cultura, da qual fui o principal responsável. O lema: Pontes para o Futuro.

televisão sillouhette

Atualidade, política, artigos de opinião, textos satíricos.

Notas, textos de opinião e de reflexão sobre os media, designadamente o serviço público de televisão, publicados ao longo dos anos. Textos  de crítica da atualidade.

Notas pessoais sobre acontecimentos históricos. Memória. Presente. Futuro.

Textos avulsos de teor literário nunca publicados. Recuperados de arquivos há muito esquecidos. Nunca houve intenção de os dar à estampa e, o mais das vezes, são o reflexo de estados de espírito, cumplicidades ou desafios que por diversas vias me foram feitos.

Imagens do Real Imaginado (IRI) do Instituto Politécnico do Porto foi o ponto de partida para o primeiro Mestrado em Fotografia e Cinema Documental criado em Portugal. Teve início em 2006. A temática foi O Mundo. Inspirado no exemplo da Odisseia nas Imagens do Porto 2001-Capital Europeia da Cultura estabeleceu numerosas parcerias, designadamente com os departamentos culturais das embaixadas francesa e alemã, festivais e diversas universidades estrangeiras. Fiz o IRI durante 10 anos contando sempre com a colaboração de excelentes colegas. Neste segmento da Programação cabe outro tipo de iniciativas, referências aos meus filmes, conferências e outras participações. Sem preocupações cronológicas. A Odisseia na Imagens, pela sua dimensão, tem uma caixa autónoma.

Todo o conteúdo © Jorge Campos

excepto o devidamente especificado.

     Criado por Isabel Campos 

bottom of page