top of page
8811.jpg
   viagem pelas imagens e palavras do      quotidiano

NDR

  • Foto do escritor: Jorge Campos
    Jorge Campos
  • 5 de jan. de 2024
  • 3 min de leitura

A caminho da Villa Torlonia - a família de Mussolini viveu aqui.

No primeiro dia do ano 2023, os museus e monumentos de Roma, de um modo geral bastante caros, abriram as portas sem custos a quem quisesse por lá passar. É uma prática habitual no Ano Novo. A oferta, vastíssima, excedia, na verdade, a área dos museus e monumentos: tinha visitas guiadas à Ópera, um concerto de homenagem a Ennio Morricone, múltiplas iniciativas no âmbito das comemorações do centenário de Pier Paolo Pasolini, enfim, não vale a pena enumerar, a lista seria interminável. Pela minha parte, inscrevi-me numa visita guiada para 25 pessoas à casa onde viveu Mussolini, na Villa Torlonia. À hora marcada, sem saber bem ao que ia, lá estava eu a subir as escadas do palacete, agora museu, estupendamente recuperado. Muito impressivo. Enquanto percorria as diversas divisões uma guia simpática ia explicando a ascensão, consolidação e queda do fascismo italiano, abordando, de passagem, episódios da vida familiar do Duce e da mulher Rachele Guidi de quem teve cinco filhos. estávamos neste ponto, colocou-se a meu lado um tipo muito alto, magríssimo, vestido de negro, a fazer lembrar uma das personagens de O Baile de Ettore Scola, um fascista. Inclinou-se e segredou-me algo que não entendi. Mas o homem insistiu, muito devagar, baixinho: “O Duce também teve um número ainda indeterminado de filhos ilegítimos.” Percebi. A guia falava já do patriarcado no tempo de Mussolini e exibia uma foto de uma família com dez filhos, todos em uniforme, alinhados em escadinha, ladeados pelos progenitores e, segundo ela, educados para serem saudáveis, as meninas boas mães e os meninos bons soldados. O tipo magríssimo afivelou um sorriso de cera, puxou-me um pouco para o lado e segredou-me: “Quinto Navarro.” Quinto o quê, Quinto Navarro, fiquei na mesma, o mordomo do Duce, ah, "Quinto Navarro disse que Mussolini teve relações sexuais com 7665 mulheres." Como? 7665 mulheres, repetiu, com os dedos unidos diante da boca e as mãos em êxtase. Esgueirei-me para junto de um casal talvez na casa dos 80, ambos impecavelmente vestidos, ela com as pregas do rosto cheias de pó de arroz e lábios muito pintados em forma de coração, ele de alfinete na gravata, bengala encastoada e luvas de pelica. Dizia a guia que pela casa, habitada pela família entre 1925 e 1944, tinham passado celebridades como Toscanini e Marconi e participantes da Marcha sobre Roma de 1922 como Bono, Balbo e Vecchi. Aludiu depois a umas quantas singularidades do Duce como sejam o apreço pela música e pelo cinema. O casal fez que sim, aprovadoramente, com a cabeça. Depois vieram os desgostos. As coisas complicaram-se. Mussolini raramente via a mulher, a filha mais velha, Edda, casada com o Conde Ciano, viu o pai mandar executar o marido também ele, de resto, quase sempre ausente do lar. Já Romano, outro filho, teve melhor sorte. Foi um excelente pianista de Jazz e casou com uma irmã de Sofia Loren. O casal de velhotes manifestava-se ora agradado ora desagradado com o relato, acenando com a cabeça. Para o fim, ficou o quarto de Rachele Guidi onde se conserva ainda a sua cama: tanto bom gosto, sussurrou-me ao ouvido a senhora de lábios pintados em forma de coração a tocar-me familiarmente no braço. Sorri o melhor que pude. Estava a lembrar-me do fim do Duce e da amante Clara Petacci executados pela Resistência e exibidos, pendurados pelos pés, na Piazzale Loreto de Milão.


p.s. Nesta viagem, não fiquei surpreendido com as novas obras e reedições sobre o Mussolini e o Fascismo à venda nas livrarias de Roma.




Mussolini, a mulher e os filhos.

Ao encontro da cicerone da visita guiada.

Explicação; história

O quadriunvirato da marcha sobre Roma de 1922 que abriu a porta à chegada do fascismo ao governo de itália: Bono, Mussolini, Balbo e Vecchi. Mussolini inspirou Hitler e outros, entre os quais Salazar, que proliferaram nos anos 20 e 30. Franco em Espanha. Gyula Gömbös na Hungria. A Guarda de Ferro na Roménia. E na Grécia, França, Lituânia, Polónia, Jugolávia... Por sinal, na maioria dos países que tiveram fortes movimentos fascistas e governos dedicadamente colaboracionistas na II Guerra Mundial é que os fantasmas ganham corpo enquanto a União Europeia assobia para o ar e vai atrás do assobio que vem do outro lado do Atlântico.

O salão e frescos da Villa Torlonia.

Edda, filha de Mussolini, casada com o Conde Ciano mandado executar pelo sogro.

O quarto da mulher de Mussolini.


Claretta Petacci, amante de Mussolini.

O Baile (1983) de Ettore Scola ou a dança da História.

  • Foto do escritor: Jorge Campos
    Jorge Campos
  • 15 de nov. de 2020
  • 1 min de leitura

Fonte: Escambray

Há anos fiz uma longa viagem por Cuba. Por toda a ilha. Passei por alguns destinos turísticos a correr e fiz muitas centenas de quilómetros de carro com diversas paragens durante as quais falei com quem bem entendi. Estive em casas de cubanos. Encontrei uma sociedade contraditória - não conheço nenhuma que o não seja -, em muitos casos disfuncional, mas com um orgulho de si própria e uma alegria de viver do seu povo como nunca encontrei em mais lado algum. Obviamente, encontrei descontentes com boas razões para estarem descontentes. Mas, surpreendentemente, foi de um deles que ouvi estas palavras a propósito das consequências do embargo americano: somos pobres, mas não somos miseráveis. Fidel Castro é uma figura gigantesca. Gigantesca pela dimensão utópica, revolucionária e internacionalista, pelo pragmatismo que o levou, mal, à fronteira da distopia embora sem nela sucumbir, pelas contradições decorrentes de ter tomado medidas duras no contexto da intromissão permanente da maior potência imperialista do mundo. Antes de Fidel, Cuba era o bordel da América. Depois de Fidel, uma pátria independente. Com grandes conquistas, designadamente no ensino e na saúde. Nessa viagem fiz o percurso dos revolucionários do Gramna. Da Sierra Maestra a Havana. Visitei os lugares de resistência. Hoje, fico contente por o ter feito. Quando do célebre julgamento após o malogrado assalto ao quartel de Moncada, em 1953, Fidel disse perante o tribunal do ditador Baptista: a história me absolverá! Eu limito-me a dizer que Fidel, apesar de tantas vezes ter discordado dele, é um vencedor da História.

  • Foto do escritor: Jorge Campos
    Jorge Campos
  • 8 de nov. de 2020
  • 1 min de leitura


Estes simpáticos rapazes são alguns dos protagonistas da famosa Marcha sobre Roma dos últimos dias de outubro de 1922. A marcha propriamente dita foi uma lástima. Uns 30 mil delinquentes de camisas negras andaram três dias a distribuir porrada com o intuito de impor o estimado Benito, inspirador de Salazar. Claro que os arruaceiros podiam ter sido parados, mas o mínusculo rei Victor Emanuel III cortou-se. E foi o que se viu. 95 anos mais tarde, os fachos estão de volta. Deixaram-se de adereços, andam de fato e gravata, mas usam na mesma camisas negras por dentro. Na Hungria, na Polónia, na Áustria, na República Checa, na Eslováquia, etc. Nalguns casos andam de braço dado com partidos próximos do PPE. Estou em crer que a direita portuguesa não deixará de alertar para a situação. Ou por outra, vamos ver.

102894510_3442382629123473_1706644122050382510_n.jpg
Jorge Campos

arquivo

        "O mundo, mais do que a coisa em si, é a imagem que fazemos dele. A imagem é uma máscara. A máscara, construção. Nessa medida, ensinar é também desconstruir. E aprender."  

120048145_341823260208071_74511127798334

Receba a Newsletter de NDR diretamente na sua caixa de email

Ouvir

Ver, Ouvir & Ler

Ler

C A T E G O R I A S

Ensaios, conferências, comunicações académicas, notas e artigos de opinião sobre Cultura. Sem preocupações cronológicas. Textos recentes  quando se justificar.

Iluminação Camera

 

Ensaios, conferências, comunicações académicas, textos de opinião. notas e folhas de sala publicados ao longo de anos. Sem preocupações cronológicas. Textos recentes quando se justificar.

Estático

Arquivo. Princípios, descrição, reflexões e balanço da Programação de Cinema, Audiovisual e Multimédia do Porto 2001-Capital Europeia da Cultura, da qual fui o principal responsável. O lema: Pontes para o Futuro.

televisão sillouhette

Atualidade, política, artigos de opinião, textos satíricos.

Notas, textos de opinião e de reflexão sobre os media, designadamente o serviço público de televisão, publicados ao longo dos anos. Textos  de crítica da atualidade.

Notas pessoais sobre acontecimentos históricos. Memória. Presente. Futuro.

Textos avulsos de teor literário nunca publicados. Recuperados de arquivos há muito esquecidos. Nunca houve intenção de os dar à estampa e, o mais das vezes, são o reflexo de estados de espírito, cumplicidades ou desafios que por diversas vias me foram feitos.

Imagens do Real Imaginado (IRI) do Instituto Politécnico do Porto foi o ponto de partida para o primeiro Mestrado em Fotografia e Cinema Documental criado em Portugal. Teve início em 2006. A temática foi O Mundo. Inspirado no exemplo da Odisseia nas Imagens do Porto 2001-Capital Europeia da Cultura estabeleceu numerosas parcerias, designadamente com os departamentos culturais das embaixadas francesa e alemã, festivais e diversas universidades estrangeiras. Fiz o IRI durante 10 anos contando sempre com a colaboração de excelentes colegas. Neste segmento da Programação cabe outro tipo de iniciativas, referências aos meus filmes, conferências e outras participações. Sem preocupações cronológicas. A Odisseia na Imagens, pela sua dimensão, tem uma caixa autónoma.

Todo o conteúdo © Jorge Campos

excepto o devidamente especificado.

     Criado por Isabel Campos 

bottom of page